A NONAGENÁRIA GASPAR NÃO DEU UM PIO A QUEM LHE DEU ESTA “INDEPENDÊNCIA” DE BLUMENAU. COISA DE ESTORIADORES

Acrecentado um parágrafo em gripo às 10h15min de 15 de março de 2024 – Já pensou se todos nós apagássemos dos nossos livros de História do Brasil, Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon? Cujo título de nobreza real e imperial era Dom Pedro I, o “Libertador” ou, o “Rei Soldado”. 

E se não contássemos que ele disse que ficava, que enfrentou os interesses da sua pátria-mãe Portugal, o que teria dito “Independência ou morte” em retrato imortalizado pintado pelo paraibano Pedro Américo de Figueredo e Mello, a única “foto” fantasia daquele Sete de Setembro de 1822 às margens do Riacho Ypiranga, em São Paulo, selando às rupturas com a coroa portuguesa?

Pois Gaspar conseguiu isso. E com o filho da sua terra, Jacob Alexandre Schmitt (1882-1950), cujo o destino quisesse fosse nomeado prefeito-interventor (1933 -1934) em Blumenau e com a caneta na mão, assinou há 90 anos (*), o decreto de emancipação de Gaspar – e outros municípios, escreva-se, também – e lá viu uma revolta – nos bastidores, mas também nas ruas dos blumenauenses que não queriam tal separação territorial.

Contei isso em várias oportunidades. E faz tempo. E nada mudou.

Então não vou me repetir. O que é de se estranhar? Que mesmo assim, o Arquivo Histórico e Documental de Gaspar não reconhece tal paternidade e nas escolas daqui não se repassa isso como parte da nossa história, 90 anos depois dela ter sido um fato real: Gaspar se tornou Gaspar independente e autônoma pelas mãos de um gasparense e que pagou politicamente caro pela decisão que tomou em favor entre outras, da sua cidade natal.

Este é o perfeito retrato de Gaspar. Nele os poderosos de ontem e hoje pintam e retocam este quadro escondendo seus personagens que deram origem à sua própria história. Um povo sem memória é um povo sem história e sem futuro. Talvez seja este o problema do presente, à falta de transparência. E ao Arquivo Histórico falta um Conselho Curador de quem esteja interessado em apurar e contar a história de Gaspar como algo coletivo, e não do ponto de vista pessoal.

Se o Arquivo Histórico de Gaspar esconde fatos, a família, que se descente de Jacob Alexandre Schmitt, está aqui e se ramifica inclusive nesta área do conhecimento, interessa-se na preservação dessa memória, também falha. Num mundo conectado se você vai a wikipédia – a enciclopédia livre da internet -, você nada encontra sobre este fato, o que fez na política e o que empreendeu Jacob Alexandre Schmitt pioneiramente em Balneário Camboriú, por exemplo. Resta lamentar a falta de memória que o tempo ajudará a esquecer ainda mais. 

(*) A emancipação de Gaspar foi assinada pelo interventor estadual (governador) Coronel Aristiliano Ramos, que estava no poder a mando do presidente de Getúlio Vargas. Coronel Aristiliano Ramos foi quem nomeou Jacob Alexandre Schmitt interventor (prefeito) de Blumenau. Também foi ele quem nomeou interventor (prefeito) Leopoldo Schramm em Gaspar. A queda de Jacob e a forma como ficou desgastado da comunidade, está ligada diretamente a emancipação documental que procedeu para Gaspar, Indaial, Timbó e Ibirama. Territorialmente, uma grande perda.

TRAPICHE

Outro exemplo de desprezo pelo nosso passado está no meu post que publiquei no dia 16 de agosto do ano passado: QUEM VAI CUIDAR DO SIMPLES TÚMULO DA MAIOR DOADORA DE TERRAS DO CENTRO DE GASPAR, A DONA MIMI HÖESCHL? HOJE AS TERRAS DELA VALERIAM CENTENAS DE R$ MILHÕES 

Com a polêmica recente lei aprovada pela Câmara e a decisão do governo de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, o espaço do túmulo de “Dona Mimi” será vendido a outro, e talvez seus restos mortais serão apenas uma plaquinha no ossário. Ela não tem descente para pagar as caras taxas que a prefeitura impôs aos “inquilinos” de lá.

Em um lugar sério, esse túmulo seria preservado por conter história de Gaspar. Foi isso que fez e lembrou em três páginas o falecido radialista, deputado estadual e ex-vereador de Blumenau, gasparense honorário, Álvaro Correia, no seu livro “Um olhar sobre fatos históricos” lançado em março de 2019. Reprodução ao lado.

O governo de Gaspar e seu Arquivo Histórico e Documental perderam, mais uma vez, a oportunidade de se redimirem em fatos históricos e na preservação da memória. Um simples decreto, ou talvez uma lei, tornaria esse túmulo patrimônio público e com a obrigação de preservação da própria prefeitura como reconhecimento a quem doou milhares de terras a cidade ao ínfimo terreno que ela ocupa hoje com seu próprio túmulo.

Por outro lado, na marquetagem para encobrir erros do seu próprio governo, Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, vão plantar mudas descendentes da velha figueira. Como foi que isso aconteceu? Retratei no dia 17 de julho em VENTO DERRUBA FIGUEIRA DA PRAÇA GETÚLIO VARGAS. GOVERNO KLEBER FAZ, MAIS UMA VEZ, ESPETÁCULO E CORTINA DE FUMAÇA PARA SE ESCONDER PROBLEMAS E ERROS DE PREVENÇÃO E GESTÃO

O plantio de mudas da velha árvore que mal cuidaram, não difere em nada, por exemplo, na preservação da memória de Jacob Alexandre Schmitt e Maria Cândida Höschl, a Dona Mimi. Por que tratamentos tão diferentes? Em ano de campanha eleitoral, árvores rendem mais. Se falarmos que foi por falta de cuidado da anciã, ficarão ainda brabos porque mela a propaganda.

Ainda bem que a memória de Frei Godofredo está preservada, mesmo que não tenhamos o seu espírito empreendedor social entre nós. A Igreja Matriz que abre este artigo foi ideia e iniciativa dele movimentando a comunidade. É hoje, praticamente, ainda, o nosso único cartão postal ou de referência. O Hospital é iniciativa dele. Os políticos de hoje o transformaram num labirinto de dúvidas e um ralo milionário de dinheiro público sem a devida contrapartida para a sociedade, principalmente, a mais pobre, o alvo de Frei Godofredo.

No lado da educação, Frei Godofredo, um alemão, todavia, mais gasparense do que de muitos dos políticos que a tocaram nestes 90 anos, pensou em ampliar o colégio que leva o seu nome, para a formação de professores (normalistas), exatamente para suprir uma demanda da comunidade. Estava à frente do seu tempo. Enquanto outros, a reboque. A sua liderança religiosa, espiritual, empreendedora e influenciadora foram decisivas. Faz falta.

Ao menos este ano, a própria prefeitura, via o seu Arquivo Histórico e Documental, via a tal “Janela da Memória” nos trouxe algo relevante deste começo antes do feito de Jacob Alexandre Schmitt, a Intendência do 2º Distrito de Blumenau, o que é hoje a Gaspar emancipada em 18 de março de 1934.

E lá estão nomes como José Spenlger, Antônio Schneider, Anfilóquio Nunes Pires, João dos Santos (que veio ser o primeiro prefeito eleito, pois o anterior Leopoldo Schramm, foi nomeado), Eurico da Silva Fontes, Luiz Franzoi. No mesmo artigo se conhece como foi dada a transferência da Intendência e até quem eram os proprietários do edifício da intendência, mas o nome de Jacob, simplesmente não aparece em lugar nenhum. Acorda, Gaspar!

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12 comentários em “A NONAGENÁRIA GASPAR NÃO DEU UM PIO A QUEM LHE DEU ESTA “INDEPENDÊNCIA” DE BLUMENAU. COISA DE ESTORIADORES”

  1. LEMBRAI-VOS DE PASADENA, por Elio Gaspari, nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo

    Encrencas têm prazo de maturação e duram anos. Hoje a Petrobras tem na mesa a encrenca da empresa de fertilizantes Unigel. Em 2019, durante o governo Bolsonaro, ela arrendou duas fábricas da Petrobras. Compraria gás e venderia fertilizantes. O mercado virou, a Unigel passou a operar no vermelho e fechou as fábricas. Voltou a operar com um novo contrato que, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU), poderá custar à Petrobras R$ 487 milhões.

    O contrato, assinado em dezembro de 2023, tem pescoço comprido, corpo malhado e cabeça pequena. Parece uma girafa. A estatal defende a virtude no negócio, mesmo sabendo-se de divergências internas e conhecendo-se a fabricação de uma ameaça de greve na Petrobras para forçar a aprovação do negócio.

    Todos os governos louvam seus contratos e a Petrobras gosta de proclamar sua onisciência. Um pouco de humildade faria bem a todo mundo.

    Em 2006 a Petrobras comprou uma refinaria em Pasadena, nos EUA, e o negócio parecia uma prova do vigor de seu cosmopolitismo. A compra foi aprovada pelo conselho de administração da empresa, presidido pela chefe do Gabinete Civil, Dilma Rousseff.

    Seis anos depois veio a denúncia de que a transação havia custado caro (US$ 1,18 bilhão), tinha pescoço comprido e cabeça pequena. Afinal, sete anos antes a refinaria havia sido negociada por US$ 42,5 milhões. A essa altura, a doutora Dilma estava na presidência da República e em 2014 divulgou uma nota revelando que aprovou a compra da refinaria porque recebeu “informações incompletas” e um parecer “técnico e juridicamente falho”.

    A gênese dessa nota é um dos mistérios das relações entre os caciques do petropetismo. No dia seguinte, as investigações do Ministério Público desembocaram na prisão de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras e a “Operação Lava-Jato” entrou na vida nacional.

    A usina de malfeitorias que operava na Petrobras havia sido estancada com a nomeação de Philippe Reichstul em 1999. Ela voltou a funcionar em 2003. Se a compra da refinaria de Pasadena tivesse sido examinada com lupa a partir de 2006, talvez não tivesse acontecido a Lava-Jato. Preferiu-se varrer o caso para baixo do tapete, mesmo sabendo-se que lá escondiam-se muitas coisas.

    Numa decisão escalafobética do Tribunal de Contas, todos os seis integrantes do conselho de administração que aprovou a compra da refinaria de Pasadena ficaram com seus bens bloqueados por cinco anos.

    Esse desconforto deveria servir de advertência para todos os hierarcas que, sem qualificação técnica, engordam seus salários com boquinhas em conselhos .

    CULPA DO MORDOMO

    Amanhã Lula reúne o Ministério. Entre os temas, parece estar o mau resultado saído das pesquisas.

    Se tudo der errado vão dizer que o problema é de comunicação.

    Essa é uma maneira de evitar o debate em torno das tolices que são comunicadas.

    MADAME NATASHA

    Madame Natasha gosta de ouvir o ministro de Minas e Energia porque ele é capaz de elogiar o governo ao dar bom dia. A senhora concedeu-lhe uma de suas bolsas de estudo porque, no meio da confusão da partilha dos lucros da Petrobras ele disse o seguinte:

    “É uma questão muito dinâmica. (…) O governo do presidente Lula tem trabalhado com muito cuidado no respeito à governança da Petrobras.”

    Valendo-se da retórica dinâmica dos palacianos, quis dizer que os dividendos retidos poderão vir a ser distribuídos, com um recuo do governo em relação à desastrada decisão de retê-los.

    UM TESTE PARA TARCÍSIO

    Diante da repercussão da morte de 43 cidadãos na Baixada Santista, o governador Tarcísio de Freitas desabafou: “Pode ir na ONU, no raio que o parta, não tô nem aí.”

    Esse é seu jogo e está jogado. Ampara-se num preconceito segundo o qual “bandido bom é bandido morto.” Não há provas de que todos os 43 mortos fossem bandidos, mas eram todos pobres.

    A qualquer momento o doutor pode entrar na pista para a sucessão presidencial de 2026. Como faltam quase dois anos, ele terá tempo para cuidar de outro caso de sua jurisdição.

    O ex-tenente-coronel da PM paulista José Afonso Adriano Filho, encarcerado no presídio do Tremembé (SP), onde cumpre desde 2017 uma pena de 52 anos por peculato e fraude em licitações, disse o seguinte ao repórter Rogério Pagnan:

    “Todas as unidades (gestoras executoras da PM) têm caixa 2. Todas (as 104) têm. Quem falar que não tem está mentindo.”

    As denúncias do ex-tenente-coronel foram investigadas pela PM e arquivadas. Vá lá. Mas Adriano argumenta que a Corregedoria nunca rastreou o dinheiro das empresas vencedoras de licitações, nem as contas dos oficiais que denunciou. Ele informa que tem 194 documentos para provar o que diz e que entregou 14 aos investigadores em 2017, quando negociava uma delação premiada. Ela não foi aceita.

    Tarcísio pode “não estar nem aí” para a ONU, mas pesa sobre a fala de Adriano uma urucubaca do presidente francês Georges Clemenceau (1841-1929) e vale repeti-la: “A Justiça Militar está para a Justiça assim como a música militar está para a música”.

    Afinal, o bordão segundo o qual “bandido bom é bandido morto”, não prevê que morram só pobres.

    A GREVE E O SOLDADO

    No seu resgate da História do Brasil através de canções, Franklin Martins trouxe à tona mais uma raridade. É o tanguinho “Greve e o Soldado”, criado durante a greve geral de 1917 em São Paulo. Ele nunca havia sido gravado e a partitura parecia perdida. José Ramos Tinhorão achou-a e passou-a ao Instituto Moreira Salles.

    Nela, o soldado adverte:

    “— Vá se embora, sua greve

    Se não entra no pau já.”

    E a greve responde:

    “— Não tenho medo do pau

    E tampouco da morte!”

    Márcia Tauil, cantando como a greve, Tico Moraes, como o soldado, e Farlley Derze ao piano, gravaram-na e Martins colocou-a no seu site Quem Inventou o Brasil. Nele estão mais de mil canções que contam a História de Pindorama.

    Entre junho e julho de 1917, 50 mil trabalhadores pararam em São Paulo. Era um tempo em que o senador Alfredo Ellis dizia que não se podia legislar sobre as horas de trabalho. Férias e repouso semanal eram sonhos.

    O “pau” matou vários grevistas e 10 mil pessoas acompanharam o caixão de um deles. A cidade tinha 300 mil habitantes.

    Ao fim da greve, saiu um aumento de 20%, os presos foram libertados e, em tese, acabaram-se o trabalho de mulheres à noite e o de crianças com menos de 14 anos.

    Naqueles dias o czar Nicolau II já havia abdicado ao trono de todas as Rússias, Leon Trotsky tinha saído de Nova York e chegou a São Petersburgo, mas estava preso.

    Lênin deixou a Suíça num trem alemão, incentivou um golpe, fracassou e vivia escondido. Meses depois, tentaria de novo.

    O roceiro Emiliano Zapata legislava na Cidade do México.

  2. PROPRIEDADES DA MELANCIA, por Eliane Cantanhêde, no jornal O Estado de S. Paulo

    Além de deliciosa, suculenta e refrescante, a ciência política acaba de descobrir outras propriedades da melancia: é indigesta para candidatos a ditador, impede golpes de Estado e faz bem à democracia. Acusados de “melancias” pelos golpistas, oficiais de alta patente não cederam às “ordens”, pressões e constrangimentos do então comandante em chefe das Forças Armadas e, assim, frustraram a decretação de estado de defesa e anulação da posse do presidente legitimamente eleito.

    Se a melancia é verde por fora e vermelha por dentro, nenhum dos oficiais legalistas, como o atual comandante do Exército, general Tomás Paiva, é ou seria “vermelho” ou comunista. É ridículo, mais uma farsa, uma fake news grosseira para manipular mentes e corações vazios e suscetíveis a mitos, Messias, salvadores da Pátria. Aqueles oficiais foram apenas o que 100% de militares deveriam ser: legalistas, batendo continência à Constituição e aos poderes constituídos.

    O foco da PF e do STF está na fase aguda do golpe, quando já discutiam as minutas do golpe e do pronunciamento em que Bolsonaro anunciaria estado de defesa, fecharia o TSE e anularia as eleições e a posse de Lula. O golpe, porém, começou já nos primeiros dias do governo Bolsonaro e esquentou com a demissão da cúpula militar, que se negou a aderir. Daí, emergiram na Defesa os generais Walter Braga Netto e Paulo Sérgio Nogueira, para fazer o jogo sujo.

    As investigações entraram em fase final com os depoimentos dos ex-comandantes do Exército Freire Gomes e da FAB Baptista Jr., que confirmaram o papel central do então presidente no golpe e estão a anos-luz de serem comunistas ou “cagões”, como o general foi chamado por Braga Netto, que jogava blogueiros suspeitos contra os quatro-estrelas antigolpe. A PF deve concluir nesta semana o inquérito dos atestados falsos de vacina. Depois, o das joias e, por fim, até julho, antes do semestre eleitoral, o do golpe liderado por Bolsonaro. Depende, porém, da lenta e trabalhosa perícia em celulares e computadores.

    Bolsonaro está inelegível até 2030 e, se condenado por tentativa de golpe, atentado violento contra o estado de direito e organização criminosa, estará sujeito a 30 anos de prisão e de suspensão de direitos políticos. Assim, usa e abusa do que lhe resta: multidões. Isso pode incendiar o País.

    E Lula? Acerta ao ficar calado, mas não deixa de se informar. Na sexta-feira, por exemplo, estava no Rio Grande do Sul, em eventos oficiais com o diretor-geral da PF, Andrei Passos Rodrigues. Dirão que conversaram sobre “amenidades”. Alguém acredita?

  3. FHC E O REAL, 30 ANOS, por Celso Lafer, no jornal O Estado de S. Paulo

    Há 30 anos teve início o Real, que debelou anos de alta e crônica inflação, com efeito corrosivo no dia a dia da vida das pessoas. Teve um impacto perdurável. Transformou a sociedade brasileira, propiciando a previsibilidade econômica e social das expectativas.

    A moeda não serve apenas para comprar e vender. É, como a língua e a bandeira, um símbolo nacional, na observação antropológica de Darcy Ribeiro. Tem, com sua dimensão de credibilidade, uma função aglutinadora fundamental. Foi o que observou FHC em A Arte da Política, livro de reflexão sobre a sua experiência, em que dá relevante destaque ao que foi a tarefa política da implantação do Real, um dos seus duradouros legados para o País.

    O legado de um homem de Estado se mede, ensina Joaquim Nabuco em Balmaceda, pelo inventário de como encontrou o País e como o deixou. O saldo do legado de FHC é múltiplo e altamente superavitário. Um dos seus grandes componentes é o Real, fruto da sua atuação como ministro da Fazenda do governo Itamar Franco e que se aperfeiçoou nos seus dois mandatos presidenciais.

    A consolidação do Real como moeda tornou-se uma adquirida conquista da sociedade brasileira. FHC foi seu grande e democrático timoneiro. Teve a liderança no delinear dos rumos, soube mobilizar o conhecimento técnico para viabilizar os rumos da estabilização e, com o seu domínio das “artes da política” e sua capacidade de se comunicar e convencer a sociedade brasileira, construiu o caminho do Real. A coragem, o sentimento de suas próprias forças, é uma indispensável virtude política. FHC possui esta virtude forte e a revelou ao deixar o “à vontade” de sua qualificada atuação no Itamaraty e o seu papel na articulação política do governo, e aceitar o convite-convocação do presidente Itamar para ser o seu quarto ministro da Fazenda. Uma responsabilidade assumida em meio a uma inflação de 30% ao mês, tendo como pano de fundo quatro recentes planos de estabilização fracassados. Cabe lembrar que era grande o ceticismo dos atores políticos e econômicos na capacidade de FHC, nas incertezas da conjuntura da época e no pouco tempo que tinha pela frente, em razão do término do mandato de Itamar para levar a bom termo a sua desafiante empreitada.

    FHC identificou no imprevisto do convite-convocação para assumir o Ministério da Fazenda – que ele não buscou e não estava nos seus planos – uma grande oportunidade para servir, ao seu tempo na vida brasileira. Ulysses Guimarães, com sabedoria política, observou que há horas difíceis para uma tomada de posição. Pontuou que todo político tem o seu Rubicão. Atravessa-o e se consagra ou estanca na sua margem e se liquida. FHC, ao aceitar o Ministério da Fazenda, atravessou o seu Rubicão e se consagrou como estadista.

    Itamar Franco não era uma personalidade fácil, mas era um homem de bem, preocupado com a inflação. FHC tinha o benefício do seu prévio convívio e conhecimento no Senado. Itamar deu a FHC liberdade para a formação de sua equipe técnica.

    Uma das características da liderança de FHC e de sua visão estratégica era a sua convicção de que “o grande político é o homem que consegue juntar pessoas de talento”. Reuniu uma equipe de qualificados economistas que se tinham dedicado aos temas da teoria econômica da inflação, examinando com vocação acadêmica as razões que levaram ao fracasso planos anteriores e concebendo alternativas inovadoras. Tinha no relacionamento com a sua equipe o indispensável dom da autoridade reconhecida e consentida.

    A organização do plano complementou-se com uma indispensável articulação no Congresso, cujas inúmeras dificuldades na tramitação de necessária legislação FHC deslindou com seus dotes de parlamentar respeitado e apreciado pelos pares. Obteve encaminhamento da dívida externa que adicionou credibilidade internacional à sua gestão. Arrematou o caminho do Real com a originalidade da URV.

    A URV, uma unidade de conta com reajustes diários, conviveu temporariamente com o desvalido cruzeiro até sua extinção, quando foi substituído pelo real com a paridade estipulada pelo dólar. Como sintetizou FHC, a URV foi matando a inflação com seu próprio veneno.

    Explicar o Real e a URV para a sociedade brasileira não era tarefa fácil, não apenas pela sua complexidade técnica. Era necessário superar com transparência as desconfianças do passado recente e indicar que o plano não envolvia congelamento de preços e salários ou qualquer tipo de medida arbitrária ou surpreendente.

    Foi a convicção democrática de FHC que abriu os caminhos do Real. É o que explica seu empenho obsessivo de persuadir a sociedade brasileira, de formar os consensos mínimos dentro do governo, no Congresso, com os partidos e entre os agentes que tomam as decisões ou impedem que sejam tomadas.

    Nos 30 anos do Real e na proximidade dos 93 anos de FHC, é justo dizer, pelo recorte deste artigo, que graças à sua atuação ele ampliou até os dias de hoje o controle da sociedade brasileira sobre o seu destino.

  4. Para ler e refletir, várias vezes. Esta é a razão pela qual a esquerda é chamada do atraso. E também, o porque os políticos – seja de qual matiz ideológico – o são, muitas vezes corrompidos por lobbies de interesses desses atrasos, que parecem as das indústrias das velas diante da invenção da eletricidade.

    ABERTURA DO PAÍS A COMPETIÇÃO EXTERNA JÁ, editorial do jornal Folha de S. Paulo

    Enquanto a Comissão Europeia discute tarifas adicionais sobre a importação de carros elétricos chineses, soa corajosa a manifestação do principal executivo da montadora alemã Mercedes Benz.

    Ola Källenius disse ao jornal britânico Financial Times que o caminho deveria ser o inverso. “Não elevem as tarifas, reduzam-nas”, pois a melhor forma de lidar com a competição asiática é confrontá-la com “produtos melhores, tecnologia melhor, maior agilidade. Deixar a competição acontecer”.

    O debate europeu, sobre majorar um imposto de importação hoje fixado em 10%, parece uma amostra irrisória de protecionismo se comparado à situação brasileira.

    Tão logo assumiu, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não só deu cabo da isenção tarifária para a importação de carros elétricos como estipulou uma cavalgada aduaneira que elevará essa barreira, escalonadamente, para 35% —o gravame típico para importar veículos no Brasil— em julho de 2026.

    Bloqueia-se o acesso do consumidor brasileiro à via mais rápida e menos onerosa de modernização e descarbonização da frota.

    Pior, elimina-se a competição externa e reforça-se o estímulo à baixa produtividade e à produção de bens de qualidade inferior à do mercado internacional.

    Essa é, na essência, a proposta do programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), que vigora como medida provisória desde dezembro do ano passado. A iniciativa promete presentear as montadoras com R$ 19 bilhões em abatimentos tributários até 2028.

    Trata-se de um rótulo novo para um remédio antigo e comprovadamente ineficaz. A mentalidade da clausura, da “autonomia” industrial, permeia a política econômica brasileira há muitas décadas e tem no PT um intérprete obsequioso.

    Submete-se o consumidor a produtos tecnologicamente defasados e caros em troca de lorotas a respeito de um desenvolvimento local que nunca acontece, como o provam reiteradas reedições dos programas protecionistas.

    As tarifas brasileiras para importar máquinas são quatro vezes a média mundial. As para trazer manufaturas de fora, duas vezes. O Brasil é dos mais longevos campeões do protecionismo global, mas sua produtividade está estagnada há mais de quatro décadas.

    O exemplo a seguir deveria ser o do agronegócio e da aviação: investir em capacitação humana e técnica e na adaptação às cadeias globais de produção. Abrir a economia ao choque competitivo externo.

    É o melhor incentivo à produtividade. Foi a abertura dos mercados que levou China e outros asiáticos ao aumento da renda que tirou milhões de pessoas da pobreza.

    Chega de locupletar meia dúzia de lobbies com dinheiro do contribuinte a pretexto de substituir importações. Chega de privar a sociedade de beneficiar-se da revolução tecnológica em curso no mundo.

    É preciso abrir a economia brasileira, não fechá-la ainda mais como deseja o pensamento petista.

  5. POR QUE O POVO NÃO APLAUDE, por Carlos Alberto Sardenberg, no jornal O Globo

    Lula causou muitos problemas para seu próprio governo nas últimas semanas. As intervenções desastradas na Petrobras e na Vale não apenas destruíram valor dessas duas companhias, em que a União tem dinheiro aplicado, como prejudicaram o ambiente de negócios. Justamente quando o governo precisa da adesão de investidores privados para tocar ao menos alguma coisa de seus planos grandiosos.

    Nenhum governo conseguiria construir refinarias, navios e plataformas de petróleo e, ao mesmo tempo, tocar pesados investimentos em transição energética. Além de gerar dúvidas sobre a viabilidade, traz uma incerteza programática: qual o foco, o óleo ou o verde? Ali no núcleo do Planalto, responderão: os dois alvos. Mas, de novo, não há dinheiro para tudo nem, ao que parece, capacidade de organizar e implementar políticas que tragam capital privado.

    Mas Lula continua com sorte. A casa está caindo para o lado de Bolsonaro, e a economia oferece bons sinais. Na semana, saíram indicadores referentes às vendas do comércio varejista, volume de serviços prestados e abertura de vagas formais de trabalho, todos referentes a janeiro; e todos muito bons.

    Um detalhe interessante: dos cinco grandes setores de serviços, sabem o que mais brilhou? Serviços de informação e comunicação, cujo volume cresceu 1,5% em relação a dezembro passado. E, dentro desse item, pergunto de novo: quais os de melhor desempenho? Os serviços audiovisuais, de edição e notícias, com espantosa expansão de 27,6% em janeiro sobre dezembro. Aqui vamos do streaming às mídias tradicionais. Isso mostra que as pessoas estão consumindo mais notícias. Claro, o IBGE mede volume, não qualidade, mas é sempre bom que circulem mais notícias. Se boas ou ruins, corretas ou fake, isso depende do juízo do público.

    Nesse ambiente incluem-se as disputas de narrativas. Pessoal do Lula alardeia que os bons resultados da economia decorrem diretamente da ação do governo. Duvidoso. Começa que o governo tem apenas um ano, pouco tempo para mover uma economia do tamanho do Brasil. Depois, o único programa econômico de porte é a nova política industrial — coisa do Alckmin e de alguns lobbies — ainda no papel, sem atrair entusiasmo de Lula e de Haddad.

    O ministro da Fazenda segue na sua batalha para manter o espírito do ajuste fiscal. Tem conseguido pontos e alguma indulgência. Todo mundo acha que a meta de déficit zero não será cumprida, mas deve ser mantida mesmo assim. Tem lógica. Se abandonada a meta, o estrago será muito maior. Problema grande: muita gente no governo e no PT quer se livrar logo da meta e acelerar os gastos, especialmente agora que caiu uma ficha que não esperavam. A avaliação do governo e do presidente está em queda.

    Mas como? — pergunta-se em Brasília. A inflação caiu, há mais emprego, a renda real subiu — o que mais querem? Tem Bolsa Família mais abrangente, um ganho no salário mínimo, promessa de financiamentos para os mais pobres. Por que não repercute positivamente para o presidente?

    Essa perplexidade revela que Lula e seu pessoal mais próximo acreditam que as velhas agendas ainda deveriam trazer a satisfação do público. Ou que o próprio Lula seria suficiente para atrair o povo. Esquecem-se de muita coisa. Primeiro, que a vitória de Lula foi muito apertada, e ele não fez nada para atrair gente do outro lado. Segundo, que a inflação está desacelerando, mas a vida continua cara. Se um produto sobe de 10 para 20 num determinado mês, a inflação aí é de 100%. Se, no mês seguinte, o preço continua em 20, a inflação é zero. Mas o produto continua custando vintão.

    Além disso, quando Lula esculhamba o mercado e os acionistas especuladores da Petrobras, isso eleva a alma da militância, mas as classes médias gostariam mesmo era de poder lucrar com as ações da Petrobras. Também gostariam de empregos melhores nos setores de ponta (piloto de drone, por exemplo), temem a inteligência artificial, como mostram pesquisas, e querem comprar barato na Shein. Que o governo quer taxar.

  6. AS UTILIDADES DE TRUMP, por Demetrio Magnoli, no jornal Folha de S. Paulo

    Viktor Orbán, Putin e Lula não votam nas eleições americanas, mas proclamaram suas preferências. O primeiro-ministro húngaro declarou-se por Trump, uma manifestação sincera e interessada. Putin e Lula declararam-se por Biden, em gestos de ilusionismo político movidos por razões distintas.

    Orbán visitou os EUA sem se reunir com Biden: foi direto a Trump, rompendo o mais básico protocolo diplomático. Líder da direita nacionalista europeia, ele professa as mesmas ideias que o virtual candidato republicano.

    No plano internacional, mantém uma pouco discreta parceria com a Rússia e critica o apoio da União Europeia à Ucrânia. No plano ideológico, compartilha com Putin o conceito da “nação de sangue” apoiada nos pilares da família tradicional e da religião cristã. O triunfo de Trump asseguraria a seu projeto autoritário e à direita conservadora do Velho Mundo um aliado poderoso, capaz de contrabalançar as pressões das democracias europeias.

    “Para nós, quem é melhor, Biden ou Trump?”, perguntou a Putin um jornalista amestrado russo. A resposta surpreendeu: “Biden. É mais experiente, previsível, um político ao velho estilo”. Mentira evidente, proferida de cara limpa. Biden classificou Putin como “ditador assassino”, um “puro bandido” que nutre “cobiça covarde por territórios e poder”. Mas o “puro bandido” tem motivos mais sérios para torcer por sua derrota.

    A sobrevivência do regime de Putin depende do desenlace da guerra imperial na Ucrânia. Por isso, mais ainda que em 2016, Trump é o candidato dos sonhos de Putin. O republicano despreza a Otan e, no seu encontro com Orbán, prometeu cortar totalmente a ajuda dos EUA aos ucranianos.

    A resposta falsa à indagação encenada cumpre a função política de confundir o debate eleitoral sobre política externa nos EUA: a cada vez que for acusado de operar como despachante dos interesses de Putin, Trump se refugiará na declaração do chefe do Kremlin. O líder russo falou para o eleitorado dos EUA, ofertando material aos marqueteiros republicanos.

    Lula seguiu a linha de Putin: “Eu obviamente acho que o Biden é mais garantia para a sobrevivência do regime democrático no mundo e nos EUA”. Contudo, ao contrário do líder russo, o presidente brasileiro tem escassa relevância no debate eleitoral americano. Seu apoio, igualmente insincero, não se destina ao público dos EUA, mas aos brasileiros. Justamente por isso, não poderia dizer coisa diferente.

    No Brasil, o nome de Trump está indissoluvelmente associado ao de Bolsonaro –e a polarização com Bolsonaro é o talismã que Lula carrega no bolso. Tudo que de reprovável faz o governo, inclusive as iniciativas mais ignóbeis derivadas da parceria com Lira, encontra legitimação retórica no alegado risco da “volta de Bolsonaro”. Democracia versus autoritarismo –eis o mantra lulista.

    Palavras enganosas. Lula pouco se importa com a “sobrevivência do regime democrático no mundo”, como atestam os casos de Cuba, Venezuela e Nicarágua. Sobretudo, porém, sob o ponto de vista dos conceitos de política internacional de seu governo, Trump funciona bem melhor que Biden.

    A política externa brasileira subordina-se à ideia de uma coalizão anti-ocidental estruturada ao redor dos Brics –ou seja, basicamente, da China e da Rússia. “Sul Global” é a fórmula que expressa esse conceito, uma atualização da tradição terceiro-mundista. A solidariedade (mal) disfarçada à guerra de agressão russa decorre dessa visão geopolítica de fundo.

    O neo-isolacionismo de Trump –ou seja, sua inclinação a romper a aliança erguida no pós-guerra entre EUA e Europa– adapta-se às prioridades internacionais da esquerda petista. Um “imperialismo” trancado na sua fortaleza nacional: eis o cenário ideal para Lula. Por isso, nos EUA, Lula e Bolsonaro têm o mesmo candidato –mas só o segundo pode pronunciar seu nome.

  7. ARESSOCIALIZAÇÃO DO ZÉ, editorial do jornal O Estado de S. Paulo

    A comemoração pelos 78 anos de José Dirceu, na quinta-feira passada, mostra que o sistema penitenciário brasileiro funciona: o petista, devidamente ressocializado depois de ter sido preso três vezes, reuniu em torno de si boa parte da cúpula do poder numa mansão do Lago Sul, em Brasília. O beija-mão que se viu naquela festa mostrou que nenhum dos inúmeros reveses jurídicos e políticos de que Dirceu padeceu por ter se metido em toda sorte de malfeitos durante os primeiros mandatos do presidente Lula da Silva parece ter lhe tirado os ares de consigliere.

    Nem parecia que os cerca de 500 convidados do aniversariante – entre os quais figuravam políticos de todos os matizes, advogados, empresários e jornalistas – estavam reunidos em torno de um criminoso condenado por delitos graves em várias instâncias do Poder Judiciário. Decerto a costelinha de porco, o feijão tropeiro, o sorvete do Pará e a perspectiva de poder oferecidos no banquete pareceram tão saborosos aos convivas que a vergonha passou longe dali.

    Não se sabe exatamente por que Dirceu celebrou seu aniversário, que é hoje, na quinta-feira. O fato é que Brasília é conhecida por se tornar um deserto nos fins de semana. Sendo a festa num dia útil, convenientemente, puderam abraçar Dirceu – e lhe emprestar prestígio – o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, o presidente da Câmara, Arthur Lira, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, e o deputado Guilherme Boulos, pré-candidato à Prefeitura de São Paulo. Postulantes à sucessão de Lira no comando da Câmara, os deputados Elmar Nascimento, Marcos Pereira, Antonio Brito e Isnaldo Bulhões foram outros que, entre um brinde e outro, foram ouvir os conselhos do mandachuva petista.

    Lula não prestigiou o amigo, mas, além de Alckmin, fez-se representar pelos ministros José Múcio Monteiro (Defesa), Fernando Haddad (Fazenda), Nísia Trindade (Saúde), Alexandre Padilha (Relações Institucionais ) e Silvio Costa Filho (Portos e Aeroportos).

    A noite de festa pode ter sido maravilhosa para todos os que lá estiveram. Mas, para a grande parcela da sociedade brasileira que não perdeu a memória nem o juízo, o bolo servido foi indigesto.

    Num discurso que soou quase como uma ameaça ao País que deseja se desenvolver social e economicamente com responsabilidade, Dirceu defendeu não só a reeleição de Lula em 2026, como ainda mais um mandato petista, no mínimo, até 2034. “Nós (os petistas) não temos mais 30, 40 anos. Nós temos dez anos para fazer as mudanças”, disse o aniversariante. “Nós não chegamos ao governo com maioria no País. Nós chegamos ao governo pelas circunstâncias históricas do bolsonarismo.”

    Deve-se reconhecer que José Dirceu, um dos líderes de facto do PT, segue sendo um dos mais argutos e lúcidos estrategistas políticos do partido. Sua clareza de diagnóstico sobre as circunstâncias excepcionalíssimas que permitiram a volta de Lula e do PT ao poder parece faltar ao próprio presidente da República. Não se sabe se Lula tem a compreensão de que o que levou uma apertada maioria de eleitores a reabilitá-lo nas urnas foi o golpismo bolsonarista. O que seus atos e palavras demonstram, na direção diametralmente oposta, é que ele parece acreditar que sua vitória representou a chancela do eleitorado à agenda petista.

    Que não haja ilusões. Dirceu está em franca campanha para voltar formalmente ao poder. Se Lula hoje, com um séquito de auxiliares que nem remotamente têm a história e a experiência política de seus primeiros assessores palacianos, já está inclinado a retomar políticas que, comprovadamente, quase levaram o Brasil à ruína no passado recente, tanto pior será com alguém muito mais inteligente e capaz, como Dirceu, a seu lado nessa empreitada rumo ao atraso.

    Para que não seja o País a sofrer com a ressaca, seria prudente que uma direita democrática e responsável se articulasse para enfrentar essa força retrógrada. Afinal, como o próprio Dirceu admitiu, caso a direita não tivesse sido sequestrada por um desqualificado como Bolsonaro, o PT jamais teria voltado ao poder.

  8. Olá!

    Segundo a obra “Homenagem a Leopoldo Schramm”, organizada pela Prefeitura em 1982, o homenageado ficou à frente do Paço Municipal durante 12 anos, na qualidade de interventor e, na sequência, como prefeito eleito.

    Na mesma obra há um extrato da diplomação desta eleição (a primeira da cidade), realizada em 01 de março de 1936. As quatro seções eleitorais contabilizaram 997 votos: Leopoldo Schramm (Partido Liberal Catarinense) recebeu 607 votos, José Spengler (candidatura avulsa) recebeu 387 votos e foram contabilizados ainda 3 votos em branco.

    Por sua vez, a obra “Memória Gasparense – Panorama Político”, de 1992, de autoria da dona Leda Baptista, registra que, para a Câmara Municipal, neste mesmo pleito, o Partido Liberal Catarinense recebeu 604 votos (elegendo 3 vereadores) e o Integralismo recebeu 385 votos (elegendo 2 vereadores).

    O segundo pleito foi realizado em 1947, onde concorreram João dos Santos, pelo PSD, e João Batista Beduschi, pela UDN.

    Ademais, a história e o pioneirismo de Jacob Alexandre Schmitt (filho de Adão Schmitt e Catarina Haendchen) são dignos de registro merecem ser reconhecidas.

    Saudações!

    1. Obrigado pela leitura e por compartilhar mais da história de Gaspar e seus pioneiros, tão maltrada por quem deveria difundí-las por gerações como memória de uma comuniudade, cidade e um povo

  9. VAREIO, editorial do jornal O Estado de S. Paulo

    No dialeto do futebol, diz-se que um time goleado de forma humilhante pelo adversário tomou um “vareio”. Pois é isso, um vareio, o que as forças de segurança estão levando dos dois prisioneiros que há um mês, completado ontem, fugiram de onde não deveriam fugir, a Penitenciária Federal de Mossoró (RN), que supostamente seria de segurança máxima.

    Para marcar a data e tentar dar um ar de seriedade ao engajamento do governo federal na caçada aos fugitivos, o ministro da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, viajou ao local e fez um sobrevoo pela região de Baraúna, cidade na divisa entre o Ceará e o Rio Grande do Norte onde se acredita que os bandidos ainda possam estar. Não se sabe ao certo o que Lewandowski viu lá de cima, mas, ao pisar em terra firme, o ministro afirmou que as buscas estariam “se desenvolvendo com êxito”.

    Ora, como é óbvio para qualquer cidadão minimamente sensato, êxito seria o retorno de Rogério Mendonça e Deibson Nascimento, dois perigosíssimos criminosos condenados, para trás das grades – e desta vez em local um tanto menos expugnável do que a penitenciária potiguar. Lewandowski, no entanto, parece se contentar com bem menos. Na visão do ministro, o suposto bom andamento das buscas pelos fugitivos pode ser atestado pelo fato de eles estarem “cercados” em um “perímetro amplo e variável”. Seja lá qual for essa área, o certo é que Rogério e Deibson seguem dando dribles da vaca nas autoridades, que perderam seus rastros nos últimos dias. Um vexame para as forças de segurança do Estado.

    Durante uma entrevista concedida logo após uma reunião com policiais envolvidos na recaptura, Lewandowski deixou transparecer a sua conhecida inexperiência na área da segurança pública – problema, justiça lhe seja feita, que diz menos sobre ele do que sobre seu chefe. Aos repórteres, o ministro assegurou que as forças do Estado “estão empenhadas na operação” para levar os dois criminosos ligados ao Comando Vermelho de volta ao cárcere. Que alívio, pois imagine o leitor se acaso não estivessem.

    O presidente Lula da Silva, por sua vez, prometeu “ampliar o espaço de investigação”. De acordo com o petista, em entrevista ao SBT, “vai chegar um momento em que você não vai continuar procurando (na mesma região). Mas, por enquanto, a gente tem que ficar lá (em Baraúna) porque a sociedade está assustada. E são dois bandidos perigosos”. A obviedade não esconde o fato de que o governo está zonzo. Do ponto de vista operacional, talvez possa fazer sentido aumentar o número de ações de recaptura mais ostensivas. Mas força bruta sem cérebro tem pouca serventia.

    Ações de inteligência têm sido privilegiadas pelas forças de segurança nos âmbitos federal e estadual? Se sim, um mês desse baile que os dois bandidos estão dando num enorme contingente de agentes sugere que elas têm sido ineficazes. Decerto os fugitivos estão recebendo ajuda, mas era esperado que o Estado, do alto de seu poderio humano e material, fosse capaz de romper essa rede de favorecimento. Sobretudo porque, como afirmou o próprio ministro Lewandowski, os criminosos estariam cercados.

    A essa altura, as autoridades deveriam se preocupar menos com a criação de factoides e mais com o planejamento e ações de inteligência que possam cortar o afluxo de recursos que têm permitido que Rogério e Deibson prossigam foragidos. A cada dia que passam fora do cárcere, é bom enfatizar, os criminosos humilham o Estado brasileiro.

    Evidentemente, a recaptura dos dois fugitivos deve ser a prioridade zero do governo federal. Está-se lidando com criminosos de altíssima periculosidade, condenados por crimes de sangue, entre outros, e vinculados a uma das mais poderosas organizações criminosas do País. Mas logo o ministro Lewandowski terá de dar à sociedade as respostas às perguntas que permanecem em aberto, algumas delas óbvias.

    Como Rogério e Deibson conseguiram escapar com tanta facilidade de um presídio que deveria ser de segurança máxima? Qual o grau de envolvimento de servidores públicos com a fuga? Como o governo federal pretende fazer com que essa fissura vergonhosa no sistema penitenciário federal não sirva de incentivo para que outros detentos acautelados em prisões federais não se sintam encorajados a fazer o mesmo?

  10. LULA E O PREÇO DA COMIDA, por Vinicius Torres Freire, no jornal Folha de S. Paulo

    O presidente da República e ministros fizeram questão de dizer nesta quinta-feira (14) que vão tomar providências a fim de diminuir o preço da comida. Tudo bem. Vai ser bom se aparecerem com medidas inteligentes e práticas.

    É política básica, quando não necessária, demonstrar que o governo se ocupa de um assunto obviamente importante e que, talvez, seja um motivo da queda de popularidade de Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo que menor.

    Difícil é cravar que as altas de preços do final do ano até agora sejam o motivo da piora do prestígio de Lula. Difícil também fazer algo prestante no curto prazo.

    Ao menos nas pesquisas Quaest e Ipec, o grosso da perda de popularidade de Lula ocorreu entre setembro e o final do ano. Há algum outro gato nessa tuba.

    Houve alta importante nos preços da comida neste ano, sim, embora a inflação dos alimentos (“alimentação no domicílio”) desde o início do governo Lula até fevereiro passado tenha sido de 2,4%, ante 5,9% da inflação média, do IPCA.

    Na média, sob Lula, o preço médio da comida aumentou bem menos do que o valor médio dos salários.

    O preço dos alimentos deu alguns saltos recentes por causa de tempo ruim no Sul e no Centro-Oeste. Ainda assim. O problema é que a comida está cara faz tempo, considerada a variação dos salários, o que não vai mudar tão cedo, mesmo com providências inteligentes e ajuda dos céus (chuva e temperatura).

    Desde janeiro de 2020, pouco antes da epidemia, até janeiro deste ano, a comida que se compra e se leva para casa (“alimentação no domicílio”, no dizer do IBGE), aumentou em média 46,6%.

    O salário nominal cresceu em média 31,1%. Tirar essa diferença vai levar tempo —anos de aumento de salário e contenção de preços do que se come.

    É certo que preços de alimentos essenciais aumentaram muito recentemente. Desde janeiro de 2023, o arroz ficou em média 37,4% mais caro. O feijão preto, 26,7%. No entanto, o grupo de farinhas, massas e macarrão ficou apenas 1% mais caro. O de carnes caiu quase 10%; aves e ovos, baixa de uns 5%.

    Da reunião de Lula saiu que se vai fazer algo a fim de melhorar a oferta de crédito rural, usar contratos futuros para tentar evitar variações excessivas de preços e um vago algo mais.

    Ainda que se faça algo inteligente, nada vai fazer efeito tão cedo. Talvez no ano que vem e olhe lá, se o tempo por aqui e no restante do mundo ajudar.

    Lula não pode fazer chover, conter chuva excessiva ou moderar o calor, fatores que provocaram perdas nesta safra 2023/2024. Seu governo pode inventar sistemas de seguro rural mais eficientes, refinar a oferta de crédito, pensar o que se passa na área plantada de cada produto. Mas não vai ter milagre.

    Falta mais crescimento de PIB e de salário, recuperar o prejuízo de uma década.

    O risco óbvio é “partir para ignorância”. Tomar medidas erradas ou contraproducentes, não apenas na política agrícola.

    Por exemplo, querer bulir com taxas de juros de bancos públicos (com o que bancos privados talvez não emprestem relativamente mais e ainda “empurrem” clientes problemáticos para bancos estatais). Em suma, inventar intervenções ineptas.

    Pior ainda, o governo pode largar chumbo grosso em alvos errados. A popularidade em baixa pode se dever à política. Há noticiário ruim: o governo escorrega em bananas que ele mesmo jogou na calçada.

    Pode haver uma nova onda de campanhas virtuais da oposição ou da ultradireita a respeito de assuntos como drogas e crime ou sabe-se lá o que circule por esse mundo. O conflito pelas redes sociais e de mensagens é permanente, vem em ondas como o mar, agora em um indo e vindo infinito de alta frequência.

    O lugar da política mudou muito e frequentemente nem sabemos onde fica e o que passa por lá.

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