A frase do título é do ex-primeiro ministro brasileiro (sim, já tivemos um primeiro ministro no ordenamento do Estado), o mineiro Tancredo de Almeida Neves (1910/85, ontem 21 de abril fez 40 anos do seu falecimento; e por causa disso, assumiu a presidência e deu lugar a José Sarney, antes dele ser MDB). Recomeço. Por que? Gaspar já esteve no Consórcio Intermunicipal do Médio Vale do Itajaí – o CIMVI – desde 2009, conforme lei 3.145 daquele ano, a 2023, onde estão atualmente 14 pequenos e médios municípios da região – como Gaspar ainda é – se servindo mutuamente de uma estrutura de suporte complexa, incluindo os que não do Médio Vale do Itajaí Ilhota, Luiz Alves e Massaranduba e que entraram recentemente.
E é a partir daqui que começa a se estabelecer o erro, o irracional e a esperteza como combustível deles. Achando-se autossuficiente como os grandes Blumenau e Brusque, por exemplo, Gaspar (políticos, çábios, entidades e empresários) depois de cobrado naquilo que era obrigação para permanecer no CIMVI, resolveu sair dele. Com Lei e tudo.
A iniciativa foi do ex-prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, seus “çábios”, por orientação dos empresários do ramo, com aprovação unânime da Câmara de Gaspar. Nem mais nem menos. Parte desta mesma Câmara, seis vereadores, está reeleita para dar um cavalo de pau, com discursos hipócritas e tudo, se o atual “delegado prefeito” Paulo Norberto Koerich, PL, resolver atender ao apelo oficiado a ele, vejam só, pela Associação Empresarial de Gaspar, a Acig, a que ficou quietinha quando da retirada de Gaspar do CIMVI, bem como o Núcleo Imobiliário dela, o que naquela época, diferente do que quer hoje, aprovava a tal saída de Gaspar do CIMVI, como se fosse uma alforria da cidade, da burocracia e dos negócios do setor.
NADA COMO UM DIA APÓS O OUTRO
O documento que foi dar na prefeitura é simples, óbvio e necessário (na minha avaliação). Entretanto, no fundo ele esconde, na mistura de alegações genéricas, uma esperteza do passado – e do presente – que se quer corrigir agora, e que todos que armaram mais esta, esperam que eu não toque nela.
O que bem diz este documento suscintamente?
Que “entre os principais objetivos do CIMVI está a promoção da gestão integrada e sustentável da região, com atuação destacada nas áreas de turismo, meio ambiente e saúde pública. Os serviços prestados pelo consórcio incluem: Gestão do turismo regional no Vale Europeu Catarinense; Licenciamento ambiental integrado, otimizando prazos e processo; Programas de educação ambiental e ações de conscientização; Gestão e valorização de resíduos sólidos, com projetos como o Parque Girassol e a campanha “Vale Muito Cuidar”; Serviço de inspeção de produtos de origem animal, com foco na qualidade alimentar e na defesa do consumidor“.
O que está bem embrulhado na descrição acima é o pedido específico e desesperado do Núcleo Imobiliário da Acig: o tal “licenciamento ambiental integrado, otimizando prazos e processos“. O resto que está no ofício é enfeite para não chamar a atenção e esconder a omissão e o erro da entidade que sempre validou todo o governo de Kleber.
O PLANO DIRETOR COMO DECORAÇÃO E NÃO COMO AGENTE DE ATUALIZAÇÃO E DIRECIONAMENTO DA CIDADE
E por que? Porque Gaspar parou no tempo da atualização do seu primeiro e único Plano Diretor desde 2016, quando deveria ele ter sido revisado, com a participação de técnicos, entidades e a população como manda o Estatuto das Cidades. Os políticos e empresários, uniram-se, criaram e acharam que a gambiarra deles neste ambiente com o governo Kleber lhes favorecia naquilo que projetavam para seus negócios e empreendimentos. E a conta chegou. E é cara. Ela simplesmente paralisou os negócios ou os colocou na Justiça via os questionamentos do Ministério Público e denúncias dos próprios técnicos contratados pela prefeitura obrigados a isso para não prevaricar.
Num acordo com o governo Kleber, os empreendedores resolveram licenciar aqui mesmo os seus empreendimentos. A maior parte, ao arrepio da Lei e do Plano Diretor, retaliando-o, burlando-o, usando este expediente entre “amigos e aguado com indicados pelos políticos de estimação”. Foi para criar facilidade a uns e punir adversários e críticos. Afoitos, pois ninguém é ingênuo e desinformado neste ambiente de empresários, loteadores e investidores, foram enganados. Simples assim. Agora, estão amargando e arcando com os prejuízos. Pior, estão expostos na reputação e ainda, gastando dinheiro para se defenderem na Justiça de crimes contra o meio ambiente, cedendo parte de seus empreendimentos e projetados lucros para compensação, ou até lutando contra embargos.
E os políticos de estimação dessa gente? Flanando como se não fossem sócios desse beco sem saída em que meteram os empresários.
Eu exagero? É só olhar as inúmeras atas, quando elas existiram, do tal Conselho de Desenvolvimento Urbano – coalhado de gente com interesses em empreendimentos e que deviam estar impedidas em algumas daquelas decisões – e os Projetos de Lei, sustentados por estas atas e audiências públicas sem interessados, que aportaram na Câmara. Tudo com a finalidade de validar as “mudanças”, na maioria dos casos, isoladas e muitos pontuais contra o velho e defasado Plano Diretor, que tanto o governo como o meio empresarial não se quiseram mudá-lo de verdade e igualitariamente. Preferiram essas cirurgias técnico-administrativas pontuais.
E tudo sob o olhar e participação direta e indireta do Núcleo Imobiliário da Acig. Expandiram-se áreas urbanas, industriais e comerciais ao gosto e tamanho do freguês; alteraram áreas industriais para zonas de interesses ambientais como punição a críticos; criaram e desapareceram com vias projetadas antes e depois de ocupações irregulares intencionais de áreas; e em decorrência disso, concederam irregularmente licenciamento ambiental para empreendimentos, iludiram e causaram prejuízos a investidores e trouxeram insegurança jurídica ao setor. Não se cuidou da infraestrutura de suporte a esse desordenamento territorial (escolas, postos de saúde, mobilidade, transporte público, luz, agua…). Afastaram a vinda de empresas. Nem mais, nem menos.
QUAL FOI O RESULTADO DESSES ANOS DE ESPERTEZAS E INCERTEZAS?
Está quase tudo parado no Ministério Público. E quem foi à Justiça para permanecer na esbórnia, está sendo derrotado, sucessivamente, por ser frágil a realidade na argumentação técnico, procedimental e jurídica feita no governo Kleber diante da legislação mínima que regula este setor não apenas aqui.
Gaspar – por seus políticos no poder de plantão, seus padrinhos e amigos, queria ser uma ilha de autossuficiência no licenciamento ambiental. E deu com os “burros n’água”. Por quê? Fez isso, ao arrepio da legislação nacional, via comissionados, alguns deles, sem a mínima qualificação para o que autorizou. Obedecia-se o desejo do político no poder de plantão. Ou seja, quase tudo é nulo por vício de origem, mesmo isso tendo custado caro e com fachada de legalidade. Na verdade, é a tal esperteza que comeu o próprio dono.
E quando Kleber não teve outra alternativa, forçado que foi pelo Ministério Público, a não ser montar em Gaspar uma cara e autônoma área com técnicos e especialistas concursados, tudo travou. E travou porque estava viciado, errado e não porque os técnicos são exigentes demais como se alega tanto na burocracia da prefeitura, ou entre os políticos de ontem e hoje, como no ambiente da Acig, bem como no Núcleo, dos empresários de terraplanagem e imobiliários e de investidores (e incluo quem quer vir aqui instalar empreendimentos que demandem áreas estruturadas).
E para completar este cenário da gestão irresponsável que levou os empresários à compra coelho de raça pura por lebre doente, cheia de sarna, o prefeito Kleber, no dia seis de abril de 2023, em dívida, cobrado naquilo que devia ao CIMVI, enviou à Câmara o Projeto de Lei Complementar 6/2023. Mesmo diante da tormenta que atormentava o setor, o PLC pedia a autorização para a saída de Gaspar do CIMVI. O que Kleber alegou? Laconicamente: “a municipalidade não utiliza de qualquer dos serviços do consórcio público, há necessidade de retirada do Gaspar do CIMVI“.
O NOVO GOVERNO NÃO QUER TRANSFORMAR LEBRE DOS OUTROS EM SEU COELHO SARNENTO
Gaspar não utilizava o CIMVI. Rejeitou-o por 15 anos. Agora, os mesmos “çábios” que o orientaram à esta decisão, acham ele fundamental para Gaspar. Estranho. É a urgência dos afogados. É, finalmente, a sensatez que desta vez orienta o pedido da Acig e do Núcleo Imobiliário. E por duas razões principais: não somos autossuficientes, nem conhecedores, nem atualizados o suficiente nesta área. Mais: esta autossuficiência é cara e burocrática. Segundo, estar no CIMVI facilita, em muito, a consolidação metropolitana de serviços, apoio e integração em várias áreas da Saúde, Educação, Assistência Social, Turismo e Mobilidade do Médio Vale do Itajaí, o tal Vale Europeu, e que alguns municípios da Foz do Itajaí melhor perceberam do que Gaspar e estão usufruindo.
O nó criado e descrito acima contra empreendedores e investidores travado por se ter uma Superintendência de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável autônoma, técnica e capaz em Gaspar e que se quer agora eliminá-la não está expresso no documento. Ela é assim, porque se fez de forma equivocada e se quis perpetuar no erro como nos tempos do faz de conta. Então, restou, polida e disfarçadamente, criar um clima para a volta do CIMVI a Gaspar e isolar a atual estrutura própria de Meio Ambiente da prefeitura de Gaspar.
Repetindo e que fiquem todos advertidos: não será do dia para a noite esta mudança e eliminação do setor na prefeitura de Gaspar, até porque há documentação farta alimentando o Ministério Público naquilo que se fez errado e como se quer consertar, sem consertar de verdade.
Ou seja, e concluindo: que o pessoal da Acig – que perdeu a influência regional e estadual, bem como a importância ativa dos tempos de um Vilmar de Oliveira Schürmann, Francisco Mastella ou Samir Buhatem -, e o Núcleo Imobiliário dela, pense que a ida isoladamente das questões ambientais de Gaspar para o CIMVI vai apagar a aventura de que são parceiros deste desastre em que a cidade está metida no ramo imobiliário, aterros, jazidas e um Plano Diretor esfacelado. Advertidos estavam. Há dezenas de artigos aqui com o mesmo sentido.
É, finalmente, apenas o reconhecimento – que negavam e enfrentavam – de que não querem permanecer com esta insegurança contra si, seus associados e a cidade diante dos resultados negativos que vêm colhendo e somando contra este setor. Por outro lado, estão vendo como seus vizinhos vão resolvendo-os e aproveitando as oportunidades de expansão imobiliária, negócios, empregos, geração de renda e tributos com gestores e políticos de melhores visões.
Ah, para participar do CIMVI, como Gaspar fingia que nada era com ela, como tudo é consorciado, há regras. Entre elas, a de compartilhar os custos, como informou em ofício ao então presidente da Câmara, Ciro André Quintino, lá em junho de 2023, o diretor executivo do CIMVI, Fernando Tomaselli. Então, quem vai bancar isto? Muda, Gaspar!
TRAPICHE
O Brasil possui oito cardeais que podem ser papas. Sete podem participar do Conclave, por terem menos de 80 anos. Três são catarinenses: João Braz Aviz, 77anos, nascido em Mafra e Cardeal emérito de Brasília, mas trabalhando no Vaticano; Dom Leonardo Ulrich Steiner, 74 anos, nascido em Forquilhinha (terra de outro cardeal, Dom Evaristo Arns) e Cardeal de São José do Rio Pardo SP; e Dom Jaime Spengler, 64 anos, nascido em Gaspar, arcebispo de Porto Alegre e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
Todos os sete cardeais com menos de 80 anos podem votar. Todos os oito, todavia, podem ser votados. A chance de um brasileiro ser papa, é remota. É um intricado jogo. Dos catarinenses, esse remoto, está com o gasparense Dom Jaime que esteve há semanas em Gaspar e rezando missa na capela Santa Clara, do seu bairro, o Poço Grande.
Sem obras, resultados, projetos e mudanças para mostrarem, políticos recém eleitos de Gaspar, foram as redes sociais criarem espuma: postar reflexões sobre o sentido da Sexta-Feira Santa, melosas felicitações de Páscoa, incluindo gente que em sua religiões não possui essa tradição. Pior mesmo, foi ver ontem, todos se comoverem com a morte do Papa Francisco, inclusive os que o acusavam de comunista, defensor de gays… Credo.
O prefeito de Blumenau, delegado Egídio Maciel Ferrari é o novo coordenador regional do PL no lugar do deputado estadual Ivan Naatz, que estava nele há seis anos. Ou seja, o delegado prefeito Paulo Norberto Koerich, PL, seu ex-chefe funcional, se tornou, na política, subordinado de Egídio. A orientação foi do governador Jorginho Melo, PL.

Uma foto, dá o tom da Câmara de Gaspar. O secretário de Saúde, Arnaldo Gonçalvez Munhoz Júnior, foi convidado a dar explicações sobre a enxurrada continuadas no setor. Na reunião, praticamente, os vereadores eleitos para o primeiro mandato. A exceção estava o presidente da Casa, Alexsandro Burnier, PL, e a Mara Lúcia Xavier da Costa dos Santos, PP, “madrinha” do secretário.
Não pegou bem na cidade, principalmente entre os apoiadores do “delegado prefeito” Paulo Norberto Koerich, PL, ele ter delegado ao chefe de gabinete Pedro Inácio Bornhausen, PP, fazer uma prestação de contas atrasada, dos primeiro 100 dias de governo na rádio 89 FM. Na Câmara, a líder do governo Alyne Karla Serafim Nicoletti, PL, fez uma listinha chinfrim de conquistas destes 100 primeiros dias. Nenhum novo compromisso, nenhum projeto, nenhuma surpresa. Continuam, ambos, falando do pouco tempo e do desastre que receberam. Todos sabiam disso, tanto que foram eleitos para reconstruir. A comunicação é que é caótica neste governo.
Perguntar não ofende. Na gestão de Kleber Edson Wan Dall, MDB, e Marcelo de Souza Brick, PP, havia equipes em secretarias abonadas pelo Orçamento que recebiam R$1 mil de bônus? E tem gente reclamando e boicotando a interrupção? Como se contabilizava e se escriturava isso na prefeitura e na secretaria? Não vai haver investigação? Para que serve o Processo Administrativo Disciplinar? Muda, Gaspar!
As reclamações contra o longo tempo gasto no atendimento do Pronto Atendimento do Hospital de Gaspar começa, depois de uma trégua, a ganhar espaços “generosos” nas redes sociais. Parece que nada mudou. Pudera, a começar pelo secretário. Na Câmara, igualmente, em relação à falta de médicos nos postinhos, com a empurra de um local para o outro como Pronto Atendimento do Hospital e Policlínica. Sai governo, entra governo, gasta-se milionariamente neste setor, e tudo parece não ter controle, transparência e resultados. E isto vai dar diretamente na cadeira do prefeito. Só ele ainda não entendeu, ainda.
Novo lema da nova CPI de Gaspar, a que não vai chegar a lugar nenhum no caso das medições exageradas do lixo: “CPI não prende ninguém”. Este mantra é tanto da oposição que não quer ver nada apurado e agora, adotado pela situação, que já sabe que não vai ter voz na CPI e nem sabe o que fazer com ela se encontrar algo diferente do que a Polícia já relatou. Aos poucos a ficha está caindo para os inventores da CPI. Os governistas estão se dando conta que criaram uma cortina de fumaça que podem, eles próprios, se intoxicar com esta fumaça. Avisados estavam.
Esta semana deve sair os cinco indicados componentes desta CPI que a polícia especializada em corrupção de Blumenau já investigou e disse o que aconteceu. Se não houver uma testemunha bomba, ou um documento espetacular e irrefutável que não apareceu na investigação da polícia, haverá gasto de tempo, dinheiro, reputação da Câmara e dos vereadores, bem como do governo do “delegado prefeito” Paulo Norberto Koerich e do engenheiro Rodrigo Boeing Althoff, ambos do PL. Nem mais, nem menos. Muda, Gaspar!
8 comentários em ““QUANDO A ESPERTEZA É DEMAIS, ELA COME O PRÓPRIO DONO”. EMPRESÁRIOS E AGENTES DO RAMO IMOBILIÁRIO QUEREM, DESESPERADAMENTE, GASPAR DE VOLTA AO CIMVI”
É espantoso como o governo Lula, o PT e a esquerda do atraso tenta associar o governo anterior naquilo que era um problema e se multiplicou milionariamente exatamente no atual governo. Não se roubava os pesados impostos. Roubava-se, a conta gotas, de milhões de idosos pobres e geralmente doentes, para abastecer sindicatos e associações fingidas, com a conivência ou incompreensível incompetência do governo. E a decisão de demitir o cabeça institucional que permitiu isso, só veio por pura marquetagem: a de oferecer um culpado para baixar a poeira contra o governo em baixa. Abundavam queixas , suplícios e provas de que havia continuado abuso e roubo e o atual governo fingiu que não ele enquanto tudo aumentava exponencialmente
SÓ A DEVASSA NO INSS PODE VIABILIZAR A PAUTA DA MAIORIA, por Maria Cristina Fernandes, no jornal Valor Econômico
Uma fraude que pode chegar a R$ 6,3 bilhões no benefício previdenciário de 5,5 milhões de aposentados, nascida no governo Jair Bolsonaro e alimentada, ao longo de 28 meses, pela gestão Luiz Inácio Lula da Silva, ameaça ofuscar a pauta positiva deste governo para a base da pirâmide (isenção do IR, fim da escala 6×1 e crédito consignado).
Tanto que o anúncio da “Operação Sem Desconto”, da Controladoria-Geral da União e da Polícia Federal, foi precedido de uma vacina. Os ministros Ricardo Lewandowski (Justiça), Vinícius Carvalho (CGU), Carlos Lupi (Previdência), além de Andrei Rodrigues (PF), adotaram o tom de que o esquema havia sido desbaratado porque este governo resolveu tomar providências para proteger os aposentados. É verdade. O problema é que demoraram.
Em agosto de 2023, chegaram à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados denúncias de aposentados que passaram a ter descontos não autorizados em seus benefícios. Um requerimento, do deputado Gustinho Ribeiro (Republicanos-PB), chegou ao Tribunal de Contas da União em agosto de 2023.
Do relatório da apuração do ministro Aroldo Cedraz, aprende-se que a prática se espraiou. A Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos (Ambec) contava com apenas três filiados em dezembro de 2021. Dois anos depois, somava 601.624 associados. A Amar Brasil Clube de Benefícios (ABCB) nem existia em 2021. Dois anos depois já registrava 212.625 associados.
Nesses dois anos, a Ambec recebeu R$ 105 milhões. Já a Amar Brasil, embolsou R$ 83 milhões em repasses. Nada mal para entidades que, dois anos antes, mal existiam. A Ambec é campeã do site “Reclame Aqui”, com 7,5 mil queixas, sendo 82% referentes a cobranças indevidas. A ABCB somou 432 reclamações, sendo 70% pela mesma razão.
Notificado, o INSS suspendeu os repasses por dois meses às entidades retomando-os depois de ter informado que a documentação havia sido regularizada. A partir do relatório do TCU, a CGU começou sua própria investigação e descobriu que não foi bem assim. Um total de 80 servidores foi deslocado para a operação, a maior na história da Controladoria. Depois de entrevistar 1.242 beneficiários que reportaram cobranças indevidas, a CGU descobriu que 97,6% não autorizaram o desconto. Um percentual igualmente expressivo (96%) reportou nem mesmo estar associado às entidades que fizeram os descontos.
A CGU constatou que as entidades que o Ministério da Previdência Social disse estarem regularizadas não haviam entregue as autorizações para o desconto automático no benefício. No fim de 2024, a Dataprev recomendou que fosse adotada a biometria para autorização do desconto mas o INSS não tomou a providência.
A Polícia Federal instaurou inquérito e, nesta quarta, mais de 700 policiais foram deslocados para a operação que aprendeu até uma Ferrari e um Rolls Royce. Lacônico, o ministro da Previdência Social, que indicou o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, limitou-se a dizer que “todo mundo é inocente até que se prove o contrário”. O dirigente do INSS, afastado pela manhã, acabou o dia demitido.
Apesar das evidências de omissão, Lupi não saiu do lugar. Indagado se os descontos indevidos seriam devolvidos, disse que os beneficiários tinham a opção de anular o desconto no site do INSS e que as devoluções terão que ser analisadas “caso a caso”.
Na tarde desta quarta, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), guerrilheiro da oposição nas redes sociais, entrou na parada. A deflagração da operação conta a favor do governo, mas o enredo ofusca a pauta com a qual o Planalto esperava tomar a dianteira e dobrar partidos, a começar pelo rebelde União, e encurralar parlamentares como Nikolas.
Com o escândalo, a extrema-direita vai tentar ofuscar a isenção do IR e o fim da jornada 6×1 exibindo Frei Chico. O irmão do presidente da República, que o introduziu no sindicalismo, não está envolvido nas práticas denunciadas, mas é dirigente de uma das entidades investigadas.
A inclusão de entidades ligadas ao PT, como a Contag, que aumentou os repasses recebidos num período em que reduziu o número de filiados, e a recente filiação do presidente demitido do INSS ao PDT, que pretendia lançá-lo a deputado federal, também permite um respiro ao Centrão velho de guerra.
Pelo menos um ministro reconhece que a ofensiva da oposição pode chegar aos programas de crédito consignado que têm 20 anos mas se expandiram notadamente neste governo. O mais recente deles, do setor privado, é uma operação que exige acesso pelo gov.br, com biometria, e tem comandos integrados pelo Dataprev. Ou seja, o risco de fraude é baixíssimo. Como se trata de desconto em folha, porém, pode alimentar notícias falsas na esteira da repercussão da operação policial da semana.
Numa semana em que a inédita recusa de um convite feito pelo presidente da República a um deputado para assumir uma Pasta (Comunicações) foi interpretado como sinal de que um cargo na hierarquia do Congresso vale mais que um ministério, a operação da CGU/PF mostrou que não é bem assim. O Executivo oferece largas oportunidades para quem opera no diapasão do desvio de recursos públicos, ainda que as chances de esbarrar nos controles internos superem aquelas enfrentadas pelos novos barões do Congresso.
O ESPÍRITO DE UMA ÉPOCA, por Willian Waack, no jornal O Estado de S. Paulo
Ainda lembro bem do colega italiano Cesare de Carlo, do La Nazione (Florença), arrastando afobado uma enorme mala pesada numa das travessias do Muro de Berlim, e gritando “que disparano, que disparano”. Era outubro de 1978 e junto do espanhol José Comas, do El País (Madrid), tínhamos saído às pressas de Bonn, capital da então Alemanha Ocidental para chegar, via Berlim Oriental e dali a Varsóvia, até Wadovice, um obscuro povoado na Polônia comunista.
Éramos correspondentes estrangeiros em Bonn, e os mais próximos da terra natal de Karol Wojtyla, que havia acabado de ser eleito Papa João Paulo II. Um Papa vindo de um país comunista? Tinha sempre na cabeça a célebre frase atribuída a Stalin, quando lhe falaram da força do Vaticano: “quantas divisões (de exército) tem o Papa?”
Para mim começava uma longa jornada profissional e pessoal para tentar entender o papel da religião nas grandes mudanças políticas e a formidável presença das ideias na atuação de personagens como o Papa. Ou na figura do Ayatollah Khomeini, pois no ano seguinte eu estava cobrindo a Revolução Islâmica do Irã. Claro que economia importa, mas religião – aquilo que as pessoas acreditam no fundo–é o decisivo.
Nas décadas seguintes tive a oportunidade de cobrir alguns momentos relevantes não só no papado de João Paulo II, mas também de seus sucessores, Bento XVI e Francisco. Minha impressão como repórter é a de que mesmo à testa de uma instituição sólida e tão antiga quanto a Igreja nenhum fugiu de sua biografia e formação.
Wojtyla cresceu sob o totalitarismo comunista, e fez do combate a esse tipo de regime uma espécie de cruzada pessoal. Ratzinger tinha da Baviera (da qual, na verdade, nunca saiu) a noção do lugar do catolicismo perfeito e de exportação. Brilhante intelectual, com grande sofisticação filosófica, foi vítima dela mesma, quando não percebeu como uma rebuscada citação histórica (de um imperador bizantino do século 14) num de seus mais importantes discursos ofenderia muçulmanos ao redor do mundo.
Para “fazer o perfil” (como se diz na antiga gíria jornalística) de Jorge Maria Bergoglio fui a alguns de seus lugares preferidos em Buenos Aires – entre eles um café tradicional na Plaza de Mayo e uma “villa miseria” bem próxima à sede de seu time de futebol favorito, o San Lorenzo. Francisco era bem um jesuíta, no seu espírito “prático” e combativo, formado entre ditadura militar, desigualdade social e pobreza aumentando.
A Guerra Fria dos tempos de Wojtyla parece fichinha perto da que se registra agora. O conflito no Oriente Médio continua seguindo rachaduras de civilizações, e está piorando. E Francisco talvez tenha decepcionado “progressistas”, que dele esperavam mais, e “conservadores”, para os quais teria ido muito longe – num mundo ainda mais desigual, e escorregando para uma grande desordem. Mas cada Papa foi um tipo de resposta ao espírito de sua época. E isso importa.
IGREJA À ESPERA DE JOÃO XXIV, por Elio Gaspari nos jornais Folha de S. Paulo e O Globo
O cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio foi eleito Papa em março de 2013. Desde 2005, quando foi o segundo mais votado no conclave que elegeu Bento XVI, ele admitia a possibilidade de vir a ser escolhido e pensava em tomar o nome de João XXIV. Seria o sinal de que estava determinado a sacudir a Igreja Católica, como havia feito João XXIII (1958-1963).
Angelo Roncalli, patriarca de Veneza, foi eleito Papa aos 76 anos e acreditava-se que faria um breve pontificado de transição. Breve foi, pois João XXIII morreu em 1963, mas nada teve de transitório. Ele convocou um Concílio Ecumênico, aproximou-se das outras igrejas cristãs e diminuiu o fosso que separava os católicos dos judeus.
Depois de João XXIII vieram cinco Papas. Os avanços do Concílio foram contidos, e o catolicismo perdeu milhões de fiéis. O crescimento das igrejas evangélicas no Brasil é um exemplo dessa migração. Aferrada ao celibato dos padres e à condenação da pílula, a Igreja Católica vive uma crise de vocações e de fiéis. A isso, somou-se o escândalo multinacional dos abusos sexuais praticados por religiosos e acobertados pela hierarquia.
Centenas de padres e dezenas de bispos perderam a batina. Os casos mais explosivos foram os arcebispos de Boston e Washington, cardeais Bernard Law e Theodore McCarrick. Eles encarnavam o poder da púrpura. Amigos de presidentes, administravam fundos milionários. A primeira denúncia contra McCarrick surgiu nos anos 1980, e elas abundaram. O arcebispo parecia blindado, e em 2001 tornou-se cardeal. Em 2002, Law renunciou, mas seu colega resistiu até 2006. Treze anos depois, perdeu a batina e morreu no último dia 3, aos 94 anos.
Bergoglio queria ser João XXIV, mas, por algum motivo, teria ouvido um pedido de seu colega, o brasileiro Cláudio Hummes (1934-2022), para que pensasse nos pobres e chamou-se Francisco. Bergoglio mudou de ideia, mas não a esqueceu. No ano passado, especulando sobre o próximo pontificado, Francisco não discutia listas de cardeais, mas tentava prever o nome do novo Pontífice. Ele torcia por um João XXIV.
Francisco não sacudiu a Igreja como João XXIII, mas fez o que pôde. Enfrentou a máquina da Cúria com uma disposição que faltou a Bento XVI, levando-o à renúncia. Teve opositores ferozes e reagiu com coragem. Em 2024, Francisco excomungou o arcebispo Carlo Maria Viganò, que havia sido núncio apostólico em Washington e estava a um passo do barrete cardinalício.
Em seus 12 anos de pontificado, Francisco nomeou 108 dos 135 cardeais aptos a votar no próximo conclave. Em 2013, quando Bergoglio foi eleito, houve uma surpresa geral com a escolha de um argentino. No Brasil, o repórter Gerson Camarotti havia chamado a atenção para seu nome. Afinal, no conclave anterior ele havia sido o segundo mais votado.
Se o próximo Papa tomar o nome de João XXIV, Francisco terá deixado um legado simbólico. Três questões vindas do Concílio Vaticano II continuarão diante da Basílica de São Pedro. A saber:
1) O uso da pílula anticoncepcional pelas fiéis.
2) O celibato dos padres.
3) A extensão do poder dos bispos e de suas conferências nacionais na condução dos assuntos da Igreja.
Qualquer semelhança, não é mera coincidência
UNIÃO É A CARA DO BRASIL, por Vera Magalhães, em O Globo
Se um partido sintetiza todos os vícios que explicam a disfuncionalidade da política brasileira hoje, ele atende pelo tão cínico quanto eloquente nome de União Brasil. Formado pela junção de siglas que não tinham nada a ver uma com a outra — o PSL que havia crescido com a vinda de Jair Bolsonaro e o DEM, por sua vez ex-PFL — com o único propósito de concentrar fundos partidário e eleitoral, é um agrupamento de políticos com objetivos pessoais específicos, a serviço de um projeto empresarial de seus dirigentes.
Por isso mesmo, é sinal inequívoco da perda de capacidade de liderança de Lula levar um “não” de um deputado jovem e desconhecido de um estado fora do eixo de poder, convidado sem ter currículo algum para comandar um ministério antes relevante, mas nos últimos anos entregue ao fisiologismo sem disfarces. Qualquer leitor do GLOBO que for colocado diante de uma fileira de cinco fotografias de homens jovens de barba e terno com certeza terá dificuldade de apontar entre eles o deputado Pedro Lucas (MA), que atualmente exerce a função de líder do União.
Com exceção, talvez, dos jornalistas que cobrem o dia a dia da Câmara, nem colunistas de política talvez passassem no teste do “carômetro” para reconhecer o candidato a ministro que resolveu esnobar um convite para ser ministro de Estado. Esta colunista teve de recorrer ao Google.
Pedro Lucas Fernandes está em segundo mandato e é, como muitos parlamentares, herdeiro de um clã político local. Antes de chegar à Câmara, seu currículo só inclui ter sido vereador. Não tem experiência profissional no setor de comunicações, estratégico para qualquer país no século XXI. Ainda assim, foi confirmado com certa pompa pela recém-designada ministra da articulação política, Gleisi Hoffmann, para o lugar do conterrâneo e companheiro de partido Juscelino Filho, cuja passagem pela pasta se notabilizou apenas pelos escândalos, e não por nenhuma realização que se possa louvar.
Ainda assim, Pedro Lucas fez os cálculos e entendeu que, para sua reeleição, objetivo final e único de toda a atual safra de representantes — uma das mais fracas do ponto de vista da formulação de que se tem notícia desde a redemocratização —, era melhor não ser ministro!
A esnobada é um constrangimento inédito para quem, nos primeiros mandatos, e mesmo nas vésperas da terceira posse, em 2023, tinha de administrar uma fila de políticos disputando espaço no primeiro escalão — mas que, diga-se, nunca se notabilizou pelo zelo em designar para alguns desses postos os nomes mais credenciados para desenvolver políticas públicas de interesse do país.
Os governos Lula 1 e 2 tinham, ao lado de expoentes gabaritados que apresentaram bons resultados em pastas-chave, companheiros do petista derrotados nas urnas em outras áreas. Agora, além dos amigos resgatados, como Luiz Marinho, Lula abriu espaço para apaniguados de pessoas com quem ele nunca teve nenhuma proximidade, como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, que pendurou um monte de gente no governo sem que até hoje tenham mostrado ao que vieram.
Pior: não só nomes como Waldez Góes têm um portfólio de realizações mínimo, como sua permanência na Esplanada nunca, em momento algum, assegurou a Lula o apoio do híbrido União (sic) Brasil. Esse é o caso mais esdrúxulo, uma vez que é um partido enrolado em operações da Polícia Federal em série, com direito a pré-candidato a presidente contra o mesmo Lula que paga o salário dos ministros e as emendas dos parlamentares. A situação anômala não é exclusividade dessa sigla, é o estado geral da representação partidária brasileira.
O partido fica ali, com um pé na canoa do petista (vai que ele recupera a popularidade e vira uma pule com chance na eleição do ano que vem) e o outro na porta de saída, à espera de um barco com mais tração para navegar em 2026. Um escárnio contra o qual um governo fraco não pode fazer nada, nem se dar ao luxo de se rebelar e mandar todo mundo embora.
Nos principais jornais do mundo e do Brasil, editoriais tratam do mesmo assunto: Trump já arrumou bodes expiatórios e os colocou na sala, para justificar a sua loucura em desorganizar a governança global, taxar os outros, para supostamente salvar a velha economia que já não gera mais riqueza aos EUA, mas aos periféricos e porque eles não dominam a nova economia, no mundo de hoje
QUE O FED INDEPENDENTE CONTENHA OS DANOS DE TRUMP, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Fazem parte da cartilha do populismo ataques à disciplina fiscal e monetária, bem como a instituições independentes, que não se curvam aos caprichos do governante. Tratando-se de uma ofensiva do presidente da maior potência econômica do mundo contra o banco central de seu país, espalha-se insegurança sobre a moeda que é reserva de valor no mundo.
Donald Trump manteve na segunda-feira (21) a pressão sobre o chefe do Federal Reserve, Jerome Powell, como faz desde a primeira semana de seu segundo mandato. A cobrança bravateira pela redução imediata dos juros, a esta altura, já descambou para a grosseria pessoal —Powell foi chamado de “Sr. Tarde Demais”.
Os juros do Fed, como é conhecida a instituição, estão entre 4,25% e 4,5% ao ano, nível elevado para o padrão americano. O objetivo é conter uma inflação acima da meta de 2% anuais, que corre o risco de se agravar com as tarifas tresloucadas de Trump sobre produtos importados.
Na sexta (18), um assessor declarou que a Casa Branca estuda a demissão de Powell, que tem mandato até o próximo ano. A empreitada não soa plausível, mas a mera ameaça, num contexto de políticas caóticas nos EUA, já é suficiente para abalar o dólar.
Pela legislação, o presidente do Fed só pode ser retirado do cargo por falta grave —não por discordância quanto a suas medidas. Há, no entanto, um caso pendente de decisão na Suprema Corte sobre a possibilidade de o presidente da República demitir dirigentes de agências reguladoras, que em tese seria capaz de abranger o banco central.
As consequências, desnecessário dizer, seriam desastrosas, ainda mais diante do tumulto já produzido pela guerra comercial e do alarmante desequilíbrio orçamentário do governo americano, que antecede Trump.
Criado há mais de um século, em 1913, o Federal Reserve teve ao longo de sua história graus variados de independência. Nas últimas quatro décadas, todavia, consolidou-se nos EUA e no mundo o entendimento de que, para cumprir a missão essencial de preservar o poder de compra da sociedade, a política monetária deve ser protegida dos interesses imediatistas de governantes.
O Brasil é exemplo recente e didático desse processo. A partir do final dos anos 1990, concedeu-se ao Banco Central autonomia na prática, nem sempre plenamente respeitada, e essa condição foi enfim formalizada em 2021.
Em seu terceiro mandato, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) atacou os juros e o BC, mas ele próprio deve perceber que seu governo gastador tem sido salvo de um desastre maior pelo esforço do controle inflacionário.
Em escala muito maior, da credibilidade do Fed depende a confiança no dólar, essencial para o bem-estar das relações comerciais e financeiras privilegiadas dos americanos com o restante do mundo. Que tal compreensão prevaleça sobre o populismo inconsequente de Trump.
Bom dia.
Realmente a frase “nada como um dia após o outro” hoje cabe redondinha no nosso quintal.
A lei do RETORNO chegou.
Espero que ela seja implacável.
Não adianta DISCURSO bonito,
ir na igreja rezar,
e depois fazer tudo errado,
abusando das mordomias palacianas sem nenhum constrangimento ou pudor,
mesmo conhecedores que esses mesmos recursos são imprescindíveis para curar as feridas expostas da população mais carente da cidade.
Se não é ilegal, é imoral e contraditório ao que pregam nas igrejas que frequentam.
A POLITIZAÇÃO DO STF, por Merval Pereira, no jornal O Globo
O fato de o governo Lula 3 ser o que mais apelou ao Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2003 para tentar reverter medidas que são de seu interesse direto, como revelou o jornal O Estado de S.Paulo, acrescenta mais um problema para a conturbada atuação do STF nos anos recentes. Com o fortalecimento do Legislativo diante do Executivo, por ter maioria formada por uma oposição variada ao governo petista, e, especialmente, por ter garantido quinhão substancial no orçamento da União por meio das emendas impositivas, o Supremo tornou-se a saída para o governo e, em consequência, importante peça política na disputa entre os Poderes da República.
A politização do Supremo foi, assim, inevitável, como também a acusação da oposição bolsonarista de que ele serve ao Executivo. A mesma acusação, aliás, feita pelos petistas quando Lula foi preso depois de ter sido condenado em segunda instância, como previa decisão do STF. Se poderia dizer que, acusado pelos dois lados, o Supremo demonstra independência na polarização. Mas a mudança de posição de diversos ministros da Corte diante das mesmas questões, documentada por vídeos da época, sugere, ao contrário, que as decisões variam de acordo com as circunstâncias políticas, o que leva a uma insegurança jurídica perigosa.
O Supremo ganhou importância política central no país, mas, por causa da nossa Constituição, não se limita a ser um tribunal constitucional. Também cuida dos crimes cometidos pelos que têm foro privilegiado que, como os partidos políticos, são muitos, distorcendo nossa democracia. Nos debates que se sucedem sobre mudanças constitucionais, houve um momento em que foi proposto que o Supremo não tratasse mais dos crimes comuns cometidos por quem tem foro privilegiado, criando um tribunal especial para esses casos e deixando que o STF se ocupasse apenas das questões constitucionais.
A proposta foi feita pelo hoje presidente do Tribunal, Luís Roberto Barroso, considerado um dos maiores constitucionalistas do país. Na mesma hora, a reação do ministro Gilmar Mendes, também considerado um dos melhores constitucionalistas brasileiros, foi contrária, alegando que criaríamos um supertribunal, dando poder descomunal aos novos juízes. Ficamos, então, com esse poder descomunal depositado no próprio Supremo, que se torna pivô político fundamental no país, distorcendo o sentido de balanço de Poderes previsto por Montesquieu.
O peso que o Supremo carrega foi aumentado com a tentativa de golpe a que o governo Bolsonaro se dedicou durante todo seu mandato. Coube aos ministros do STF barrar em diversas oportunidades os avanços antidemocráticos, por isso foram alvos de ameaças pessoais e, soube-se mais tarde, de tentativas de assassinato. É preciso ser muito sensato para não transformar ameaças pessoais em institucionais. Mas é necessário que juízes supremos não se vejam como heróis que podem tudo.
Durante o período da Operação Lava-Jato, descobriu-se o maior escândalo de corrupção já acontecido no país, com ramificações por toda a América Latina. Os governos do PT colaboraram com a maioria dos candidatos de esquerda, dando apoio operacional com enviados para ajudar na propaganda política, como Duda Mendonça e João Santana, e apoio empresarial com as empreiteiras brasileiras que se internacionalizaram e tinham interesses em obras na região, entre elas a Odebrecht.
Por isso diz-se hoje que o Brasil exportou corrupção e agora importa impunidade, com o asilo extemporâneo dado à ex-primeira-dama do Peru Nadine Heredia, condenada por corrupção em seu país por ter recebido, a pedido de Lula, conforme delação premiada de Marcelo Odebrecht, US$ 3 milhões para a campanha eleitoral de seu marido, o ex-presidente Ollanta Humala, preso em seu país. O desmanche da Lava-Jato deu margem a que todos, acusados e condenados, sem exceção, fossem liberados pela Justiça brasileira com base em decisão do Supremo. A partir daí, a ética política que vinha sendo redimida com a punição inédita a políticos e empresários envolvidos em corrupção, sofreu retrocesso terrível entre nós. A corrupção voltou a valer a pena no Brasil.
O PESO DA JUDICIALIZAÇÃO, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
O impacto fiscal de decisões judiciais no Orçamento do governo federal correspondeu a nada menos que 2,5% do PIB em 2024, segundo estudo elaborado pelos pesquisadores do Insper Marcos Mendes, Cristiane Coelho, Marcos Lisboa e Leonardo Barbosa. É uma estimativa conservadora, em razão da baixa transparência das contas públicas.
O tamanho do problema fica ainda mais claro quando se verifica que esse porcentual era de 1% há 15 anos e que o gasto de 2,5% do PIB com condenações judiciais se sustenta mais ou menos nesse nível desde ao menos 2020.
Em 2023, a perda foi ainda maior, de 3,2% do PIB, uma distorção criada pela quitação de precatórios em atraso e pela antecipação de pagamentos que originalmente só seriam realizados em 2024.
É verdade que os desembolsos com precatórios judiciais e requisições de pequeno valor (RPVs) são elevados e vêm numa crescente – são 30% da despesa gerada pela judicialização –, mas, segundo os autores, eles são apenas parte de um problema bem mais amplo.
O real fardo das derrotas do governo federal na Justiça vem de benefícios previdenciários e assistenciais determinados por juízes e pagos de forma direta via Orçamento da União. Evidência disso é que, com exceção de 2023, o gasto com benefícios previdenciários e assistenciais superou o de sentenças judiciais.
De acordo com o estudo, os pagamentos determinados pela Justiça já representam 9% da despesa primária total (em 2010 eram 5%), um gasto classificado como elevado, com tendência de alta e fora do controle dos gestores.
As fontes do crescente gasto de dinheiro público com decisões judiciais são diversas, explicam os autores, o que só dificulta a solução do problema. Destacam-se, entre elas, a eterna fila de espera do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Incapaz de lidar com a própria demanda, o INSS vê a fila de solicitação de benefícios crescer, o que faz com que potenciais beneficiários recorram à Justiça. Prova disso é que estudo do próprio Insper de 2020 apontava que, num período de quatro anos, mais de 9 milhões de processos administrativos contra o INSS foram abertos.
Mudanças frequentes na jurisprudência, combinadas com a tendência do Judiciário de interpretar as leis de forma “alargada”, o que não raro resulta na concessão de benefícios a pessoas não elegíveis, só complicam o cenário.
Do lado tributário, há desde a complexidade da legislação até o que os autores chamam de tendência da Receita Federal para “dar interpretação criativa” às leis, o que abre flanco para mais contestações judiciais, exploradas por escritórios de advocacia especializados nesse tipo de ação.
A tendência do Supremo Tribunal Federal (STF) de arbitrar a favor de Estados e municípios que demandam a União também é listada pelos pesquisadores como um dos fatores que contribuem para que os gastos do governo com a judicialização só aumentem.
Se as fontes do problema são abundantes, no campo das soluções há um deserto. A fila do INSS, por exemplo, tinha em dezembro de 2024 mais de 2 milhões de solicitações de requerimento de benefício e perícia médica em aberto. Na campanha eleitoral de 2022, Lula da Silva prometeu zerar tal fila, citando o mundo digitalizado. De fato, o mundo é cada vez mais digital, mas o INSS segue em ritmo analógico.
Já o emprego de artifícios protelatórios, como a imposição de tetos para pagamentos de precatórios ou limitação à compensação de tributos, passa longe de ser solução, segundo os autores, pois, além de eles não resolverem o problema, contribuem para o aumento da judicialização.
A esta altura do campeonato, resta esperar que o Conselho de Acompanhamento e Monitoramento de Riscos Fiscais Judiciais – instituído em 2023 para, entre outros objetivos, “propor estratégias de aprimoramento da governança sobre os riscos fiscais judiciais da União” – diga a que veio. Até o momento, porém, o colegiado de caráter consultivo não tornou pública nenhuma proposta para encaminhar tão importante questão.