Eu sou, mesmo, um articulista sem palavra. Prometi na sexta-feira passada me dar férias esta semana, forçado por afazeres familiares. A ambiência de incoerências da gestão pública gasparense, mais uma vez, não me deixou livre para o meu ócio de esclarecer e opinar. Então, peço desculpas, aos que acreditaram em mim.
Na quinta-feira já estava postada no site da prefeitura de Gaspar com data de sexta-feira dia 30, a informação de que a secretária de Planejamento Territorial, trazida de Blumenau como solução para o governo do “delegado prefeito” Paulo Norberto Koerich e do engenheiro multititulado Rodrigo Boeing Althoff, ambos, do PL, após longa vacância, Ana Paula Laopolli Isensee, deixaria a pasta “a pedido” dela. Foto de abertura deste artigo extra.
Bingo. Na primeira nota da seção TRAPICHE na terça-feira da mesma semana passada da demissão da moça, em DEPOIS DA “BANCADA DO AMÉM” QUE FOI INCONDICIONAL NO SEGUNDO MANDATO DE KLEBER, VEM AÍ A “BANCADA IÔ-IÔ” COM PP e PARTE DO MDB. ELA VAI DAR “ESTABILIDADE INSTÁVEL DE RESULTADOS” NA CÂMARA AO “DELEGADO PREFEITO” PAULO, eu escrevi isto:
“É esperada para esta semana mais uma “exoneração a pedido” no governo do “delegado prefeito” Paulo Norberto Koerich e do engenheiro multititulado Rodrigo Boeing Althoff, ambos do PL. A secretária de Planejamento Territorial, Ana Paula Lapolli Isensee, trazida de Blumenau como a “solução de um novo tempo”, está sob bombardeio implacável e sem sentido, maior do que a Rússia faz contra a Ucrânia.“
Bingo pela segunda vez. Ou seja, não era mais novidade para meus leitores e leitoras, que segundo o poder de plantão não os tenho um só além de mim mesmo. Então não sei a razão de tanta preocupação…
Como sempre e mesmo assim, como sempre, fui mais uma vez desmentido e praguejado pelo poder de plantão, tão igual ou piorado neste quesito do que foram os oito anos de mandato do ex-prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB.
Foi isso, igualmente, o que aconteceu quando antecipei, ou esclareci, às razões pelas quais saíram tão cedo – e as vezes de modo surpreendente – o ex-superintendente da Fundação Municipal de Esportes e Lazer, Charles Roberto Petry, PL, numa troca de um técnico por um boleiro; o ex-superintendente de Comunicação, Felipe Rodrigues, trazido também de Blumenau e há dois meses que este cargo estratégico está vago e com mais debandadas de qualidade no setor; o ex-superintendente de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Ivan Burgonovo, também trazido de Blumenau e oficialmente sem substituto até agora.
O foco deste espaço nunca foi o de concorrer com os sites dos jornais – e outros de sobrevivência comercial – locais e regionais, obrigados pela sua essência do que são e se propõem, em “dar furos” (no senso de antecipação da notícia), mas, o de comentar fatos em si.
Eles estão apanhando dos fatos como se vê neste e outros assuntos. Até em coisas, que a cidade quase inteira sabia pelos aplicativos de mensagens, por onde a cidade se esconde e se comunica amedrontada, uma nova imagem perigosa e fragilizada que se cria de um governo que veio para mudar ao que estava instalado e não funcionava.
TROCA-SE TÉCNICOS POR HOUDINIS
Para ganhar tempo e arrumar desculpas esfarrapadas, o governo de Paulo e Rodrigo, num bate-cabeças público, está mudando suas peças que ele próprio escolheu, porque, no fundo, o verdadeiro poder que o elegeu não está satisfeito com os resultados aos interesses dele. O que funga no cangote exige soluções e que a priori, afrontam à legislação territorial e ambiental criados em administrações passadas, mas que a atual administração tende a resolvê-los tão estranhamente os problemas surgiram e viraram fantasmas para essa gente.
Um funcionário de carreira diz que o governo de Paulo e Rodrigo começou a trocar os técnicos pelos Houdinis (o húngaro Ehrich Weisz, como Harry Houdini (1874/1926) é tido um dos mais famosos escapista e ilusionista de todos os tempos). Os nomes ainda não são conhecidos do distinto público. Quem tira um, já devia ter outro escalado. É assim que o time, com uma boa comissão técnica, funciona, joga e vence em campo.
É este o foco dessas mudanças nesta área de Plano Diretor desatualizado desde 2016, segundo o Estatuto das Cidade e que agora tem assessoramento externo de quem sabe as brechas da legislação e de como fazer, para depois se recompor com multas e compensações. O assunto sai do Planejamento Territorial e entra na área jurídica. E já há denúncias dessa prática no Ministério Público.
Voltando.
Charles indicado, com reconhecida competência na área, teria que ser uma peça de decoração numa superintendência sem Orçamento. Ele se negou. Felipe não conseguia ter autonomia diante de tanta fofoca e pressão que se criava por curiosos na sua superintendência e principalmente, no próprio gabinete do prefeito. Essa gente, com arapongas, vaidosos de todos os tipos e radicais de direita, ainda não entendeu o que é comunicação, principalmente nos dias de hoje, incontrolável via redes sociais e aplicativos de mensagens. Quer enquadrar todos, não só com migalhas, mas também pelo medo e intimidação. Impressionante.
E a prova irrefutável de que essa gente se nega à transparência que condenada nos outros para chegar ao poder, veio com a demissão de Ana Paula naquilo que estava latente, sempre denunciei e se tornou um problema a ser eliminado desde há muito. Era impossível Ana Paulo não saber que estava com corda no pescoço e quem acionava o cadafalso, se eu sabia e parte da cidade também. Eu não só antecipei como expliquei as razões disso.
Na sexta-feira, Ana Paula, com humor, se disse surpreendida, com a nota estampada no site da prefeitura e a demissão que viria oficialmente mais tarde no Diário Oficial dos Municípios, e a pedido. A pedido dela, não foi, como mostram duas gravações que ela fez para a equipe antes de chegar ao trabalho na sexta-feira para se despedir dos que ficaram, bem outra de agradecimento aos que estão esperando a indicação do novo titular.
E eu preciso escrever mais. Estou de alma lavada mais uma vez. E só porque não tenho leitores e leitoras, segundo os poderosos de plantão e os que mandam neles, mas mesmo assim me querem calado, amordaçado e punido.
Como disse Ana Paula ao se despedir da equipe, conformada e protegendo o seu futuro profissional, foi mais um aprendizado. No governo, caiu mais uma vez a lenda da acusação de que eu invento. Na verdade, tenho paciência, porque as circunstâncias abundam. E neste aprendizado, parece Gaspar é que não aprendeu que dar vantagens a alguns e punição a outros iguais não é legal e a deixa vulnerável no presente e no futuro, como mostra o passado herdado que se quer resolver de qualquer maneira. Muda, Gaspar!
TRAPICHE
Se a pressão externa de poderosos acontecesse na área da Saúde, quem já estava longe era o o secretário Arnaldo Gonçalvez Munhoz Júnior. Na semana passada ele protagonizou a Audiência Pública na Câmara sobre o desempenho do primeiro quadrimestre deste ano. Ele há mais de uma década é o bambam da área. Chegou a ser até, um dos muitos secretários de Saúde do ex-prefeito Kleber Edson Wan Dall, MDB, conhecido pelo caos e dúvidas na área.
Esta audiência dizia respeito exclusivamente sobre o desempenho do governo do “delegado prefeito” Paulo Norberto Koerich e do engenheiro multititulado, Rodrigo Boeing Althoff, ambos do PL. Ninguém mais. E tudo pareceu tão igual ao governo anterior. O Hospital é um sumidouro de dinheiro bom da secretaria comprometendo os postinhos; as filas de exames e consultas especializadas continuam longas, a cobertura vacinal uma tragédia e em cinco meses, não se conseguiu sequer para o bom atendimento, ajeitar as reuniões de planejamento dos postinhos. Credo.
Dois bobões. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, PT, veio a Santa Catarina. O governador Jorginho Melo, PL, mais uma vez, não o recebeu e nem esteve presente aos eventos. Os dois, por redes sociais, falando para seus convertidos e radicais, trocaram ironias e farpas. Vergonha.
O investimento do governo Federal no porto de Itajaí e principalmente na desobstrução do canal de acesso, é relevante para o estado, o porto privado de Navegantes, inclusive, bem como para a economia como um todo e deve ser reconhecido e saudado. Mas, isso só aconteceu depois que a queridinha de Lula, a JBS assumiu o porto público de Itajaí. Antes, o governo Federal, numa disputa muito particular, deixou o porto e a região à míngua. Nem mais, nem menos. Outra vergonha.
20 comentários em “A DEMISSÃO DA SECRETÁRIA DE PLANEJAMENTO TERRITORIAL DE GASPAR MOSTROU QUE O GOVERNO ESTÁ SEM RUMO E AINDA QUER QUE ESTE ESPAÇO SEJA CONIVENTE COM A FALTA DE TRANSPARÊNCIA, DEBATE, COMUNICAÇÃO TORTA E RESULTADOS DIFERENCIAIS PARA A CIDADE, CIDADÃOS E CIDADÃS”
O SILÊNCIO QUE PODE CUSTAR CARO Reflexão do Dia (que deveria ser da vida), por Aurélio Marcos de Souza, advogado, ex-procurador geral de Gaspar (2005/08), graduado em Gestão Pública pela Udesc. Este artigo foi publicado originalmente nas redes sociais do autor
Tem dias em que a gente precisa parar e ouvir… não com os ouvidos, mas com o coração.
Hoje, 07 de junho, quero te convidar a uma dessas escutas silenciosas — mas profundas.
Sabe aquele momento em que vemos algo errado acontecendo com alguém, mas pensamos:
“Ah… não é comigo”?
Talvez uma mulher sendo ofendida na rua, uma criança sofrendo bullying na escola, alguém sendo discriminado pela cor da pele, pela fé, pela forma de amar.
Talvez uma injustiça no trabalho, uma violência disfarçada de piada, uma humilhação que parece “normal”.
E a gente assiste. Quieto.
Porque dá medo, dá preguiça, porque não queremos confusão.
E seguimos a vida.
Mas há um poema… simples, direto — e brutal — que nos chama de volta pra realidade. É de MARTIN NIEMÖLLER, um pastor protestante alemão que, no início, – FOI SIMPATIZANTE DE HITLER e apoiou o nazismo, acreditando que traria ordem à Alemanha.
Só mais tarde, quando viu o regime perseguir seus próprios colegas, religiosos e inocentes, ele entendeu — TARDE DEMAIS — o peso do silêncio.
E escreveu:
“Um dia vieram e levaram meu vizinho que era judeu.
Como não sou judeu, não me incomodei.
No dia seguinte, vieram e levaram meu outro vizinho que era comunista.
Como não sou comunista, não me incomodei.
No terceiro dia vieram e levaram meu vizinho católico.
Como não sou católico, não me incomodei.
No quarto dia, vieram e me levaram;
já não havia mais ninguém para reclamar…”
É duro, não é?
Mas necessário.
PORQUE O MAL NEM SEMPRE COMEÇA GRANDE. Ele se infiltra nas pequenas omissões, nos olhares que viram para o lado, nos silêncios que parecem paz — mas são cumplicidade.
Nos dias em que nos calamos diante do que fere o outro — até que fere a nós mesmos.
E aí… já não há quem nos defenda.
Hoje, meu convite é simples, mas profundo:
Quantas vezes você já viu algo errado e se calou?
Quantas vezes achou que não era com você?
E se amanhã for você?
Sua filha? Seu amigo? Sua fé? Sua liberdade?
Ainda dá tempo de fazer diferente.
De ser voz quando muitos escolhem o silêncio.
De ser apoio quando outros viram o rosto.
De ser presença quando o mundo escolhe a ausência.
Quando será que você vai gritar?
E… se quando chegar sua vez, ninguém mais estiver por perto para escutar?
TRÊS REGISTROS
O primeiro deles, é a insistência dos meus leitores e leitoras, que no privado, reclamam à falta de artigos no blog diante de tanta lambança na cidade. Eu prometi e não cumpri (segunda-feira teve artigo) de que não teria condições para escrever esta semana, pois demanda tempo e “investigação” e ainda estou atrapalhado com coisas familiares. Retomo no domingo ou segunda. O que esta reclamação mostra, principalmente quando os donos e poderosos em Gaspar dizem e insistem de que não tenho leitor ou leitora nenhuma, além de do meu próprio ego? O quanto quem deveria fazer o meu papel está contido, alinhado, amedrontado ou amordaçado. Muda, Gaspar!
Segundo. Hoje é dia do Stammtisch do Cruzeiro do Vale, na Arena Multiuso. Se tudo der certo, estarei lá.
Terceiro. Hoje é dia de aniversário do médico veterinário e ex-prefeito (2005/08) Adilson Luiz Schmitt, sem partido.
Muito obrigado, pelo registro do meu aniversário. São 58 anos de muitas lutas e desafios. Agradeço a Deus pela vida.
Um grande abraço!
Adilson Schmitt.
OS BRASILEIROS ESTÃO CANSADOS DELULA E BOLSONARO, por Carlos Alberto Sardenberg, no jornal O Globo
Quase metade dos brasileiros, ou exatamente 48%, considera que a economia piorou — tal é um dos resultados da pesquisa Quaest divulgada na última quarta-feira. Na rodada anterior, em março, o descontentamento era maior: 56% dos entrevistados. Houve, portanto, ligeira melhora na percepção, mas ainda assim o dado chama a atenção.
Depois de dois anos de crescimento acima de 3%, com desemprego baixo, quase metade dos brasileiros acha que a economia está pior. Mas o presidente Lula acredita que vai muito bem. Ele não perde oportunidade para alardear o “pibão” e zombar dos analistas que antecipam desaceleração. Nos bastidores, Lula cobra de sua equipe mais esforço para “mostrar” à população que o Brasil vai melhor do que ela pensa. De novo, o problema seria de comunicação. Mas não é. Outros dados da mesma pesquisa mostram que a população percebe problemas que o governo não quer ou não pode ver.
É verdade que diminuiu o número de entrevistados se queixando da alta de preços, refletindo a folga da inflação neste início de ano. Mas a maioria declara que o poder de compra é menor que há um ano. Trata-se de uma percepção exata. A inflação de alimentos até caiu um pouco, mas os preços não. Inflação menor significa que os preços sobem em ritmo menor, mas, como dizem os entrevistados da Quaest, continuam altos, corroendo o poder de compra.
Esse é um dos motivos por que a maioria considera o Brasil conduzido na direção errada — e a conta, claro, vai para o governo Lula. Aqui, não se trata só de economia, mas de vida em geral. A percepção envolve a violência urbana, a maior preocupação da população apontada na pesquisa de maio. Não adianta o governo federal dizer que a segurança é, legalmente, de responsabilidade dos governos estaduais. A questão é outra: se os governos estaduais obviamente não dão conta do problema, por que Brasília, com mais recursos, não assume o comando?
Dirão: mas não é exatamente o que o governo Lula faz com a proposta de nova lei de segurança? Pois é, mas a proposta anunciada, com forte comunicação, não avança. Todo dia, as pessoas percebem no noticiário que a bandidagem leva vantagem e que os planos governamentais continuam apenas isso, planos.
Há outras situações, aparentemente menos graves, mas que, acumuladas, causam desconforto. Entram aí as crises do Pix, a roubalheira no INSS (que reaproxima o governo da corrupção) e as trapalhadas com o aumento do IOF. Tudo culpa do governo atual, diz a população. Acrescentem as filas para atendimento no SUS e para obtenção de benefícios no INSS, e a sensação de mal-estar se amplia.
De novo, o governo se atrapalha. Assim como diante da escalada da violência, anuncia um plano. Também no caso do SUS a resposta é o anúncio de um programa, o Mais Acesso a Especialistas. No caso do INSS, Lula disse que os aposentados roubados serão ressarcidos rapidamente. Disse. É o governo dos grandes anúncios, quando a população espera, com razão, que Lula cumpra as promessas de campanha, entre as quais a eliminação daquelas filas. Mais ação, menos palavrório.
Outras situações, aparentemente de menor impacto, também causam a sensação de que o país vai na direção errada. Incluem-se aí: os supersalários do funcionalismo e de membros do governo, agraciados com valiosos cargos em estatais e outras empresas; os prejuízos de estatais; o péssimo serviço dos Correios; e, sim, as luxuosas viagens internacionais de Lula e Janja, hospedados em hotéis de alto luxo, levando comitivas numerosas, na boca-livre.
Parece que a população manifesta cansaço com essa lambança ou — dito de outro modo — com a falta de austeridade e contenção no uso do dinheiro público. Isso sugere cansaço com o Lula 3. Está aqui talvez o dado mais importante da pesquisa Quaest. Dois em cada três brasileiros acham que Lula não deveria se candidatar a um quarto mandato. E exatamente na mesma proporção, dois em três acham que Bolsonaro não deveria se candidatar a um segundo mandato. O cansaço, pois, é com a situação política, com essa polarização que tanto mal tem feito ao país.
O SILÊNCIO DOS LÍDERES EMPRESARIAIS DOS EUA, por Fareed Zakaria, escrito originalmente para o Washington Post, traduzido e publicado no jornal O Estado de S. Paulo
Antigamente, os CEOs americanos se sentiam livres para criticar as políticas governamentais, muitas vezes com uma reclamação familiar. O ex-CEO da Verizon Communications Inc., Ivan Seidenberg, explicou que ao atingir praticamente todos os setores da vida econômica, o governo estava “injetando incerteza no mercado”.
O então CEO da Cisco Systems Inc., John Chambers, concordou. “As empresas não gostam de incerteza”, disse. Isso foi durante o primeiro mandato de Barack Obama, quando o governo tentava tirar a economia de uma crise financeira global única.
Hoje, em um momento de pleno emprego e baixa inflação, o governo Trump desencadeou um tsunami de incerteza. Tarifas são aplicadas, depois suspensas, depois reativadas e, em seguida, dobradas. E o que os líderes empresariais dizem? Nada. Há exceções importantes: Ken Griffin, Larry Fink, Jamie Dimon e, claro, agora Elon Musk.
No passado, líderes empresariais costumavam protestar contra o aumento de impostos sobre as empresas. No entanto, hoje, diante de uma série de novos impostos na forma de tarifas, eles se mantêm em silêncio. Muitos CEOs nem ousam mencionar que seus preços terão de aumentar devido aos novos impostos sobre seus produtos importados. O novo imposto de 50% sobre as tarifas de aço, por exemplo, beneficiará a indústria siderúrgica. Mas estudos mostram que, para cada emprego salvo nesse setor, há 75 empregos ameaçados em setores que usam aço importado em seus produtos (como automóveis e construção civil). Você já ouviu esses CEOs reclamarem? Eu não.
Considere a hipocrisia em torno do projeto de lei orçamentária. Os CEOs há muito falam sobre os perigos dos déficits orçamentários. E, no entanto, diante de um projeto de lei que quase certamente resultará em US$ 5 trilhões adicionados à dívida nacional em dez anos, a maioria não se opôs (o Escritório de Orçamento do Congresso estima que o déficit adicione “apenas” US$ 2,4 trilhões à dívida, pois precisa lidar com os artifícios contábeis dos republicanos da Câmara, que deliberadamente suspendem alguns cortes de impostos no quarto ano, para que adicionem menos às projeções de dívida de dez anos).
APATIA.
Se analisarmos os números com seriedade, fica óbvio que a única maneira de reduzir o déficit é fazer cortes nos maiores programas, como o Medicare e a defesa, e permitir que muitos dos cortes de impostos de Trump de 2017 expirem. Em vez disso, este projeto de lei basicamente não faz nada para controlar os gastos com o Medicare, aumenta os gastos com defesa e expande substancialmente os cortes de impostos.
O que deveria enfurecer ainda mais as empresas é que o projeto de lei “atinge praticamente todos os setores da vida econômica” em uma escala impressionante. As melhores práticas para impostos são manter as regras simples e justas, aplicá-las igualmente a todos os contribuintes, minimizando distorções, soluções alternativas e manobras contábeis.
Este projeto de lei não prevê impostos sobre gorjetas ou horas extras e novas deduções para idosos e sobre juros de financiamento de veículos. Portanto, um garçom que ganha US$ 50 mil terá um desconto, mas um lavador de pratos, não.
Trabalhadores em empregos que pagam horas extras têm um desconto fiscal, mas não aqueles em empregos que podem pagar menos, mas simplesmente não as faturam como horas extras. Espera-se que muitas pessoas tentem reclassificar sua renda como gorjetas e horas extras.
CUSTO-BENEFÍCIO.
Como aponta a apartidária Tax Foundation, esses descontos vêm “com várias condições e restrições que, se promulgadas, provavelmente exigirão centenas de páginas de orientações do IRS (a receita federal americana) para serem interpretadas”.
E o IRS terá de julgar toda essa complexidade com até 40% de sua força de trabalho eventualmente demitida, o que significa que haverá muitos sonegadores que escaparão impunes de fraudes. A Tax Foundation conclui que “as novas regras e os custos de conformidade, em muitos casos, provavelmente, superam quaisquer benefícios fiscais”.
A economia americana está agora mais politizada do que nunca. Trump ameaça impor tarifas a empresas individuais como Apple e Mattel. Na quinta-feira, ele ameaçou rescindir contratos do governo com as empresas de Musk. Ele diz aos executivos que desejam tratamento favorável que o procurem pessoalmente. Esta semana, sua secretária de imprensa, Karoline Levitt, gabou-se de que os líderes empresariais estão “implorando para se encontrar com o presidente e implorando para ir à Casa Branca”.
Trump explicou como vê a economia americana: não como um vasto e gloriosamente complexo sistema de livre mercado com centenas de milhões de transações privadas. Não, para ele, é uma loja grande e bonita. “Eu sou o dono da loja e eu defino os preços e digo: se você quiser comprar aqui, é isso que você tem que pagar’”, disse.
Os líderes empresariais devem lidar com os EUA da mesma forma que costumavam lidar com as ditaduras do terceiro mundo: apaziguar o líder supremo. E eles estão se adaptando a esse novo modelo discretamente, sem discordância.
Mesmo com pleno emprego e baixa inflação, governo Trump provocou tsunami de incerteza
Há uma nova biografia publicada sobre William F. Buckley Jr., o padrinho intelectual da direita americana. Buckley era meu amigo, e me lembro dele certa vez fazendo uma declaração estranha. Ele me disse que seu país favorito no mundo talvez fosse a Suíça.
Perguntei por quê e ele explicou que se tratava de uma genuína democracia de livre mercado, onde o governo realmente deixava as pessoas em paz. “Se você perguntar a uma pessoa comum na Suíça quem é o presidente do seu país, a maioria não saberia”, disse. Nem preciso dizer que o sonho de Buckley seria o pesadelo de Trump.
O CRESPÚSCULO DO DEMIURGO, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
O presidente Lula da Silva bem que tentou aplacar o tremendo mal-estar nas hostes petistas com a mais recente pesquisa de popularidade de seu governo, convocando às pressas, de véspera, uma entrevista coletiva para exercitar a vanglória e malhar adversários. Debalde.
Por mais competente que Lula seja como encantador de serpentes e de eleitores, não foi possível minimizar o impacto da sondagem da Genial/Quaest divulgada nos últimos dias. Não só porque Lula aparece como desaprovado por 57% dos entrevistados, o pior nível desde o início de seu mandato, como começa a ter dificuldades para liderar a corrida eleitoral na hipótese de concorrer à reeleição. Como mostrou o levantamento, o petista hoje empata até mesmo com nomes de menor musculatura eleitoral, como os governadores do Paraná, Ratinho Junior (PSD), e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSD), e como a novata Michelle Bolsonaro (PL). Nas pesquisas anteriores, o único capaz de lhe fazer frente era seu antípoda Jair Bolsonaro, que está inelegível.
Isso não significa, é claro, que o destino de Lula esteja selado, especialmente considerando-se que ele desmoralizou até aqui todos os atestados de óbito político que lhe foram expedidos. Mas parece claro que o demiurgo petista, que protagoniza a vida nacional desde o final dos anos 1980, está em seu crepúsculo – não só pela idade, mas sobretudo porque parece ter perdido sua capacidade de enfeitiçar os brasileiros com sua parolagem.
A pesquisa mostra isso com clareza. Quase 80% dos entrevistados acham que a economia piorou ou ficou do mesmo jeito com o atual governo, e 45% acreditam que o terceiro mandato lulista é pior do que se esperava inicialmente. Também não se pode ignorar outro desconforto: apenas 32% da população considera que o Brasil está indo na direção correta, contra os 61% que acham que o País está no mau caminho.
O curioso é que entre a última pesquisa, há dois meses, e esta, muita coisa aconteceu: obcecado com a impopularidade, inconformado com a desaprovação e ansioso com as eleições do ano que vem, o presidente Lula anunciou no período uma leva de benefícios, entre os quais isenções para motoristas de aplicativos, linha de crédito para reforma de casas do programa Minha Casa Minha Vida, o novo vale-gás, o projeto que isenta de IR quem ganha até R$ 5 mil e outras medidas clássicas da cartilha populista do lulopetismo.
Nesses dois meses, Lula também não parou de falar, em geral com um triunfalismo totalmente dissociado da realidade, apostando na mitologia que foi criada em torno de suas qualidades como animador de comícios. Petistas sempre festejaram seus improvisos como um instrumento político poderoso, capaz de impulsionar o governo e reverter conjunturas políticas desfavoráveis. Os métodos do ex-líder sindical, no entanto, se mostram cada vez menos eficazes. O resultado é que seu governo está produzindo frustração nos brasileiros, em vez de incutir-lhes esperança de prosperar. Mesmo ante uma avaliação popular mais favorável da economia, há uma clara quebra de expectativa. A prometida sensação de bem-estar, simbolizada na “picanha com cerveja” anunciada por Lula em 2022, foi substituída pela convicção de que a vida não melhorou nem vai melhorar.
Ao mesmo tempo em que está claro que o repertório de Lula não é mais suficiente para convencer os incautos sobre as qualidades de uma gestão desde sempre prisioneira da demagogia de seu presidente, escândalos como o da roubalheira no INSS contribuem para acentuar a malaise popular em relação ao governo petista. Para quem se considera enviado de Deus para levar água ao sertão, deve ser uma frustração e tanto.
Daqui até as eleições, é claro, muita coisa pode acontecer, mas já é possível afirmar que Lula é, cada vez mais, apenas uma sombra melancólica do que já foi. “Eu sou grande. Os filmes é que ficaram pequenos”, diz a atriz decadente Norma Desmond no filme Crepúsculo dos Deuses. Como Norma, Lula pode dizer que é um gigante numa política liliputiana, no que talvez tenha razão. Mas, em seu crepúsculo, só lhe resta a nostalgia.
QUANDO PIADA DÁ CADEIA, SALVE-SE QUEM PUDER, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
A condenação de um comediante à prisão marca um ponto de inflexão alarmante na trajetória democrática brasileira. Mais do que um veredicto equivocado, é a expressão mais grotesca de uma tendência crescente: a criminalização do discurso incômodo sob o pretexto de proteger os vulneráveis. A toga virou armadura ideológica, e o Código Penal, instrumento de censura.
Léo Lins foi condenado a oito anos de cadeia e quase R$ 2 milhões em multas e indenizações, não por incitar violência ou praticar atos concretos de discriminação, mas por satirizar grupos sociais. Seu humor seria “preconceituoso”, “humilhante”, perigoso. Nada mais perigoso, no entanto, do que essa nova ortodoxia judicial que confunde o direito de não ser agredido com um suposto direito de não se sentir ofendido – e que torna o Judiciário tribunal moral, e o artista, réu político.
Uma das bases da condenação – a Lei 14.532/2023, apelidada “antipiada” – escancara o desatino. Ao prever aumento de pena quando a ofensa ocorre “com intuito de descontração, diversão ou recreação”, inverte um princípio liberal elementar: que o contexto artístico deve ser protegido, e não punido com mais rigor. Pior: cria uma categoria penal contra a liberdade artística. Uma aberração jurídica, incompatível com qualquer concepção madura de pluralismo.
Libertar o humor do arbítrio estatal não é capricho. É condição da liberdade. Desde Aristófanes até os criadores do Monty Python, Casseta & Planeta ou Porta dos Fundos, o humor sempre foi uma linguagem transgressora, perturbadora, essencial à crítica cultural, social e política. Como a arte, o humor lida com ambiguidades, exageros e contradições. Suprimir esse campo da linguagem é mutilar parte do espírito humano. Não cabe ao Estado decidir o que é engraçado – nem o que é tolerável.
As piadas de Lins são preconceituosas? E daí? A liberdade de expressão não existe para proteger discursos populares ou elegantes que não precisam de proteção, mas sim aquilo que desagrada, desafia convenções, irrita e até fere sensibilidades. Como ensinou Ronald Dworkin, reconhecer a liberdade de expressão é tratar os cidadãos não como crianças a serem tuteladas pelo Estado, mas como agentes morais autônomos, capazes de julgar ideias por si. Como advertiu John Stuart Mill, silenciar a opinião minoritária – mesmo quando absurda ou repulsiva – é roubar da sociedade a chance de confrontá-la, refutá-la e amadurecer com o embate.
O caso não é isolado. O Judiciário condenou jornalistas por divulgar com “linguagem sarcástica” dados públicos sobre salários de magistrados. Um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) mandou destruir livros com “conteúdo preconceituoso”. A Corte ameaça reescrever o Marco Civil da Internet, enquanto o governo Lula a pressiona a punir as redes sociais, atropelando o Legislativo. Tudo sob a retórica de proteção da democracia. Mas uma democracia que precisa censurar para se proteger não é uma democracia – é um simulacro.
Sob o manto das boas intenções, a sociedade brasileira flerta com duas tentações iliberais: a do Estado paternalista, que infantiliza o cidadão em nome de sua proteção, e a judicialização da vida moral, estética e cultural – como se todo dissenso precisasse ser solucionado pelo martelo do juiz criminal.
O Brasil precisa resistir a esse impulso regressivo e repressivo. Piadas ruins devem ser criticadas, e não criminalizadas. Discursos odiosos devem ser desmoralizados, e não aniquilados com prisão. O riso – inclusive o cruel, ácido, perturbador – é uma válvula essencial das sociedades livres. Retirá-lo do espaço público é sufocar a liberdade.
Como disse o historiador da liberdade de expressão Jacob Mchangama: “Combater ideias iliberais com leis iliberais só perpetua o iliberalismo”. A sentença contra Lins não protege os vulneráveis. Só os infantiliza. Não fortalece a democracia. Só expõe suas debilidades.
É hora de desfazer essa caricatura de Justiça e de revogar as leis grotescas que a sustentam. É hora de reafirmar que uma democracia em que o humor é tratado como crime não é uma democracia. Porque, no fundo, onde o riso é proibido, o pensar também está em risco.
RISO PRESO, editorial do jornal Folha de S. Paulo
Encarcerar um humorista por causa de suas piadas é medida típica de ditaduras. É deplorável que tal decisão tenha sido tomada pela Justiça no Brasil, onde desde 1985 vigoram liberdades democráticas.
Na terça-feira (3), o comediante Leo Lins foi condenado pela 3ª vara Criminal Federal de São Paulo a mais de oito anos de prisão e multa de R$ 303,6 mil.
Em 2023, o Ministério Público Federal acusou Lins de propagar discursos discriminatórios na internet contra grupos de minorias —como negros, pessoas com deficiência e nordestinos. Os vídeos eram de um show que o artista apresentara em teatros em 2022.
Para a juíza Barbara de Lima Iseppi, o humorista cometeu crimes descritos nas leis 7.716, de 1989, e 13.146, de 2015: praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião e procedência nacional e —no caso da segunda lei— de pessoa com deficiência.
A magistrada se baseia em um voto da ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), para quem o animus jocandi —a intenção de causar riso, que é excludente de tipicidade do crime de injúria— seria um recurso ultrapassado no direito e contrário à dignidade da pessoa humana.
Em novembro do ano passado, contudo, a Quinta Turma do mesmo tribunal suspendeu um inquérito contra o comediante Bruno Lambert por uma piada sobre cadeirantes. Dado o animus jocandi, não haveria evidência de intenção (dolo) de discriminar.
Em 2018, no julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Alexandre de Moraes afirmou em seu voto, seguido pela corte, que o direito à liberdade de expressão protege opiniões “que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias”.
O inciso IX do artigo 5º da Constituição diz que é livre a expressão da atividade artística. Um show de stand-up comedy é uma performance desse tipo e, por ser do gênero humorístico, tende a se valer de estereótipos e a esgarçar limites morais da sociedade.
Em 2023, porém, o Congresso Nacional caminhou em sentido diverso, ao aumentar a pena para discriminação no contexto de atividades artísticas destinadas ao público.
As piadas de Lins podem ser consideradas execráveis. Assim como são apreciadas por seus fãs, também sofrem forte desaprovação na esfera do debate público —que, nas democracias, é o setor mais indicado para lidar com disputas discursivas, justamente para evitar o punitivismo de regimes arbitrários.
SE ATÉ TRUMP E MUSK ROMPERAM, QUEM SOMOS NÓS PRA FINGIR UNIÃO? a observação é de Aurélio Marcos de Souza nas suas redes sociais, após ele perceber que as do presidente e milionário estadunidense Donald Trump e a do empresário bilionário de origem sulafricana, Elon Musk, foram invadida de farpas mútuas nesta quinta-feira, surpreendendo a todos
O presidente mais influente do planeta e o bilionário que queria reinventá-lo trocou juras de lealdade – e depois, chaves, farpas e contratos.
Começou com tapinha nas costas no Salão Oval, terminou com fechaduras trocadas e indireta no X.
Enquanto lá os dois brigam por controle do foguete e da Constituição, aqui a guerra é pelo comando do grupo de WhatsApp da base.
Lá, é sanção e sabotagem. Aqui, CPI do capim, flores do cemitério e orçamento pra fita de inauguração.
E igual lá, aqui onde o vento faz a curva… o negócio também anda feio.
Mais intilegentes e rápidos que muitos dos nossos políticos, ambos, por meio de suas assessorias, convencionaram restabelecer o diálogo nesta sexta-feira, pois fizeram as contas e os dois estavam perdendo, principalmente o político.
Vão lavar as roupas sujas, mas não mais em público. Trump recuou mais uma vez.
O PASSADISMO DECRÉPITO DO PT, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
É mesmo singular o mundo em que vivem os capas-pretas do petismo. Enquanto o governo do presidente Lula da Silva enfrenta sucessivas, permanentes e gravíssimas crises de natureza política, econômica e existencial, os candidatos à presidência do PT se reuniram na segunda-feira passada e produziram um festival de despautérios no primeiro debate público entre eles, surpreendente até para quem já espera o pior de qualquer convescote do partido.
Entre muitos delírios, três dos quatro postulantes – Rui Falcão, Valter Pomar e Romênio Pereira – defenderam estultices como a radicalização do governo lulopetista “à esquerda”, pregaram a necessidade de o partido sair em defesa de ditaduras companheiras como Cuba, Venezuela e “todos os povos que lutam contra a opressão e a exploração” para enfrentar o “imperialismo” e o “capitalismo”, esbravejaram contra a política econômica conduzida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e, previsivelmente, atacaram os juros altos e o Banco Central, hoje presidido por um indicado de Lula.
A Edinho Silva, o quarto candidato e tido como favorito da disputa, restou o papel de alvo dos demais, defensor do indefensável (Lula 3) e anteparo contra os jargões esquerdistas dos adversários. Mas, provocado por um deles, precisou dedicar parte considerável do tempo disponível a, ora vejam, debater os rumos do socialismo. “Sem socialismo a gente não derrota o imperialismo. Sem socialismo a gente não derrota a ditadura do capital financeiro”, resumiu o historiador Valter Pomar, um autodeclarado “revolucionário”, recorrendo ao passadismo decrépito do esquerdismo tradicional para cobrar do ex-prefeito de Araraquara o tratamento devido ao tema. Historicamente o PT nunca se resolveu bem nem com o capitalismo nem com o socialismo. Crítico do primeiro, pregou para o segundo o que definiu como um mal explicado “socialismo democrático”.
O atual governo de Lula, a bem da verdade, já tem os piores cacoetes da esquerda, a saber: o discurso estatizante, o culto à personalidade (o PT sempre foi e continuará a ser infinitas vezes menor do que o ego de Lula), o populismo, a aversão ao mercado e ao setor privado, o afrouxamento fiscal e a incapacidade de superar seus limites ideológicos para se apresentar como governante de todos os brasileiros, e não apenas da patota. Mesmo assim, isso não basta para os candidatos à presidência petista.
O PT também nutre simpatia especial pelo que há de mais hostil à democracia e aos direitos humanos: Cuba, Venezuela, China, Rússia, os terroristas do Hamas e os aiatolás misóginos e homofóbicos do Irã. Também faz bravatas contra qualquer preocupação mínima com a austeridade fiscal e ignora que juros altos são o preço a pagar pelo populismo lulopetista, consubstanciado na ideia segundo a qual “gasto é vida”, frase símbolo da ex-presidente Dilma Rousseff que quase conduziu os brasileiros à ruína e segue inspirando a tibieza fiscal deste quinto mandato presidencial do PT.
Num dos raros momentos de consenso – e de lucidez –, os quatro candidatos petistas reconheceram que o PT e a esquerda perderam o pulso das ruas, distanciaram-se da juventude e se mostram hoje incapazes de interpretar o pensamento e os anseios da classe trabalhadora. Só não conseguiram reconhecer duas obviedades: sua dificuldade de escapar da obtusa simplificação do conflito brasileiro em uma anacrônica “luta de classes”; e a visão, igualmente simplificadora, da “classe trabalhadora” – como se sabe, o PT ainda enxerga trabalhadores com as lentes de um trabalho e uma base sindical que não existem mais.
Este jornal já sublinhou que não está em jogo apenas a escolha de um nome para presidir o partido – se fosse só isso, a eleição petista não teria a menor importância. Mas a definição do futuro presidente do PT dirá muito sobre a bússola que orientará o futuro imediato do partido do presidente Lula. O fato é que os rumos do partido decerto afetarão os rumos do governo. A julgar pelo debate sem bússola, contudo, esses rumos poderão ser ainda mais gravosos do que já são.
CONDENAÇÃO DE COMEDIANTE À PRISÃO ATENTA CONTRA A LIBERDADE DE EXPRESSÃO, editorial do jornal O Globo
É absurda a condenação do comediante Léo Lins a oito anos e três meses de prisão por piadas num show de humor. A sentença, da 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo, determina multa de R$ 1,8 milhão e indenização de R$ 303,6 mil por danos morais coletivos. Afirma que a apresentação de Lins estimula a violência verbal e fomenta a intolerância. Não se trata disso. É absolutamente justificável repudiar as piadas dele, de péssimo gosto. Mas elas não põem ninguém em risco. São piadas — não crimes.
No vídeo “Perturbador”, Lins tenta fazer humor mirando em negros, obesos, idosos, soropositivos, homossexuais, indígenas, nordestinos, evangélicos, judeus e deficientes. Não há dúvida de que seu humor fere as regras de civilidade, é anacrônico, descolado da sociedade. Mas condenar Lins por uma forma de humor canhestra — e repugnante — equivale a censura. É incompatível com a liberdade de expressão garantida pela Constituição.
Não é a primeira vez que o trabalho de humoristas é cerceado pela Justiça. Em 2021, o apresentador Danilo Gentili foi condenado a pagar indenização de R$ 41,8 mil ao Sindicato dos Enfermeiros, além de pedir desculpas, depois de fazer piada sobre a categoria. O youtuber Julio Cocielo foi investigado por postagens consideradas racistas entre 2010 e 2018, mas acabou absolvido. Em 2021, tentou-se censurar a 48ª edição do Salão Internacional de Humor de Piracicaba porque charges criticavam a política de saúde do governo Jair Bolsonaro durante a pandemia.
Amordaçar o humor é prática de regimes autoritários. Não combina com a democracia. Durante a ditadura militar, parte da equipe do jornal O Pasquim, que driblava a censura com irreverência, criatividade e talento, foi presa pelos órgãos de repressão. Felizmente, os tempos são outros. Há quatro décadas o Brasil vive o mais longevo período democrático de sua História.
Apesar disso, nos últimos tempos têm se tornado comuns episódios de censura e cancelamentos. Livros de histórias infantis lidos por gerações passaram a ser demonizados, sob alegação de conter trechos racistas. Obras consagradas da literatura nacional foram recolhidas de escolas sob pretexto de ser inadequadas a menores. O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, chegou a mandar destruir um livro de Direito com trechos considerados por ele homofóbicos e discriminatórios.
A condenação de Lins é grave por criminalizar a piada. É verdade que suas anedotas são preconceituosas e abjetas. Mas a liberdade de expressão só está plenamente protegida quando se garante o direito ao discurso mais abjeto, desde que não ofereça risco. Sentenças como a proferida contra Lins incentivam artistas à autocensura, por receio de acabar na prisão ou pagar multas. Nada pode ser pior para a criatividade. Por fim, ninguém é obrigado a consumir o humor de mau gosto produzido por Lins. Vê e ouve quem quer. As instâncias superiores da Justiça têm o dever de reformar a sentença para preservar um regime em que os brasileiros possam se expressar livremente.
OS COMBOS INDIGESTOS DE HADDAD, por Elio Gaspari, nos jornais O Globo e Folha de S. Paulo
O ministro Fernando Haddad e os çábios que o circundam tiveram uma ideia. Nas suas palavras:
— Nós fizemos pela oportunidade de fazer um combo, prevendo receita, bloqueio, contingenciamento, mas essas medidas estão sendo analisadas há mais de um ano.
Traduzindo, o “combo”, refinada versão do velho truque de dar uma martelada no cravo e outra na ferradura, queria prometer redução de gastos (em tese) e aumento de um imposto (de fato). Deu no que deu. O Congresso sinalizou que não digere o sanduíche, o Banco Central reclamou porque não foi ouvido, e a encrenca pousou na falta de coordenação política do governo.
Haddad conhece a velha lição, segundo a qual fazer de novo uma experiência esperando que venha um resultado diferente é sinal de que alguém está com um parafuso solto.
Em outubro do ano passado, a ekipekonômica pôs na mesa outro combo. Batendo no cravo, conteria os supersalários. Indo à ferradura, confiscaria parte do seguro-desemprego dos trabalhadores demitidos sem justa causa. Assim como o Banco Central não foi ouvido adequadamente, no combo do IOF, no do confisco do seguro-desemprego não ouviram o Ministério do Trabalho. O sanduíche não foi servido.
Faz tempo. As ekipekônomicas operam num mundo fantástico. Presumindo-se onipotentes, manipulam ilusões. O combo do ano passado atolou antes de sair da cozinha, o do IOF levou a um atrito com o Congresso.
Desde seu primeiro dia no Ministério da Fazenda, o ministro Haddad sabe que as contas públicas não fecham e que seus colegas de ministério não querem cortar gastos. Promete aumentos de arrecadação ilusórios e festeja minudências. O único gasto cortado pelo governo foi a compra de um novo avião com chuveiro para Lula.
Os problemas fiscais do governo não serão resolvidos com combos ou fantasias semelhantes. Encurralado pelo Congresso, Haddad pareceu ter aceitado a ideia de uma reforma administrativa. Beleza, mas logo sacou o velho combo do ano passado:
— Nós já mandamos algumas dimensões da reforma administrativa que, na minha opinião, deveriam preceder toda e qualquer votação, que é a questão dos supersalários.
Os supersalários embolsados pelo Judiciário são uma praga difícil de corrigir. Vale a pena tentar, mas um Executivo que bomba os vencimentos de seus ministros e hierarcas aninhando-os em conselhos entra na discussão capengando.
Falta ao governo a sinalização de compromisso com a austeridade. Aqui e ali revelam-se lances nos quais, em vez de poupar, esbanja. As farofas que levam ministros a feriadões no circuito Elizabeth Arden passam ideia de turismo perdulário. É verdade que essas boquinhas fazem mais o gosto do Judiciário, mas o Executivo acaba enfeitando-as.
O lado trágico dessa feira de ilusões está na exposição de um governo que gasta demais, porém cuida do andar de baixo. É contra as políticas sociais de Lula que o andar de cima brande o estandarte da austeridade. No combo do ano passado, os çábios queriam tungar desempregados.
A nova expressão da moda é a “reforma estruturante”. Não quer dizer nada, porque o que está estruturado é o privilégio, a boquinha.
Lula foi à França, e anuncia-se que levou uma agenda para discutir a COP30. Tudo bem, a Cidade Luz tem um belo cenário, mas a Conferência da ONU será em Belém, com seus conhecidos problemas logísticos.
ATAQUE UCRANIANO À RÚSSIA REFLETE TRANSFORMAÇÃO DA TECNOLOGIA BÉLICA, editorial de O Globo
O surpreendente ataque da Ucrânia que destruiu bombardeiros russos em solo no domingo é um marco na evolução da tecnologia militar. Desfechada de forma sorrateira, a operação mostrou que um enxame de pequenos drones caseiros de plástico, movidos a bateria, foi capaz de provocar danos irreversíveis à principal plataforma de Moscou para lançamento aéreo de mísseis, inclusive os nucleares.
A Ucrânia tomou o cuidado de gravar vídeos dos ataques. Afirma ter usado 117 drones, atingindo bases aéreas em cinco regiões, de Murmansk, perto da fronteira com a Noruega, a Belaya, no extremo oposto do país, a cerca de 4.400 quilômetros de Kiev. O principal alvo foram os tradicionais — e eficientes — bombardeiros russos Tupolev (Tu-22 e Tu-95), aviões de longo alcance estratégicos na política de dissuasão nuclear. Eles têm sido usados para disparar mísseis à noite contra a Ucrânia. Antes do ataque, mais de cem estavam em operação. A Ucrânia afirma ter destruído ou danificado mais de 40. Analistas calculam, com base em imagens de satélite e vídeos, que no mínimo 14 foram atingidos. Foi a maior perda da aviação russa desde a Segunda Guerra. Uma perda irreparável, pois a indústria aeronáutica russa não consegue mais fabricá-los.
A operação Teia de Aranha foi planejada durante um ano e meio, segundo o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky. Caminhões levando no reboque casas pré-fabricadas de madeira com os drones escondidos entraram na Rússia e se dirigiram à vizinhança das bases aéreas, onde foram estacionados. Depois, bastou acionar os drones à distância e jogar a carga explosiva sobre os aviões.
A operação ucraniana tem levado potências bélicas a reavaliar suas estratégias no contexto de rearmamento que tomou conta do planeta com a volta de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos. O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, apressou-se a anunciar que o Reino Unido destinará £ 2 bilhões, de um incremento total de £ 20,3 bilhões no orçamento militar, para drones e outras armas táticas em desenvolvimento. Os Estados Unidos, onde surgiram os drones, correm risco de perder a liderança nessa nova tecnologia bélica. Isso porque os drones leves, hoje responsáveis por 70% dos danos em combates, são fabricados basicamente com plásticos moldados, ímãs e baterias elétricas — mercados em que os chineses levam grande dianteira sobre os americanos.
“O ataque ucraniano aos bombardeiros nucleares da Rússia mostra quão insana e autodestrutiva é a oposição dos republicanos à indústria de baterias”, escreveu em seu blog o economista Noah Smith. “Se os Estados Unidos se recusarem a fabricar baterias, serão incapazes de fabricar drones similares em caso de guerra contra a China.” Em vez de transformar as baterias elétricas em joguete de sua guerra cultural contra o carro elétrico e fontes alternativas de energia, Trump deveria, diz Smith, entender que elas se tornaram questão de segurança nacional.
PODER DE POLÍCIA A TORTO E A DIREITO, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
O Estatuto Social da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), em seu artigo 3.º, é bastante claro: a finalidade da empresa é organizar o sistema viário em suas diversas necessidades, desde o planejamento até sua exploração econômica, passando por fiscalização e educação. Em nenhuma linha ali ou em qualquer lugar está escrito que os agentes da CET podem exercer poder de polícia.
Mas isso não é mais um problema. O Senado, no embalo da aflição popular em relação à segurança pública, acaba de aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para incluir as guardas municipais e os agentes de trânsito no sistema de segurança pública. Se o texto passar na Câmara, os guardas municipais e os agentes de trânsito entrarão na lista dos integrantes das corporações responsáveis pela “preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”.
Eis aí a solução do Congresso para resolver o problema da sensação de insegurança nas grandes cidades: distribuir poder de polícia a torto e a direito. É evidente que este jornal não se opõe, de maneira nenhuma, ao aumento da capacidade do Estado de policiar. Mas não se pode promover esse aumento de maneira indiscriminada, sem levar em conta necessidades óbvias como treinamento adequado e demarcação clara de competências.
Isso demandará formação teórica, respeito ao protocolos, uso de câmeras corporais, capacidade de diálogo e atuação conjunta com outras corporações, de modo a não haver embates como ocorrem entre polícias civis e militares, além de forte controle externo, por meio da supervisão do Ministério Público, de corregedorias atuantes e de ouvidorias independentes. Sem isso, o que teremos é um grande número de agentes do Estado autorizados a exercer o poder de polícia sem qualquer preparo técnico para isso e sem definição de limites de atuação, o que acarreta evidentes riscos para a sociedade.
A confusão já havia ganhado escala com a decisão do Supremo Tribunal Federal de dar às guardas municipais a possibilidade de atuar no policiamento ostensivo, o que não estava previsto na Constituição, que atribuía essa função à Polícia Militar, sob o comando dos governos estaduais. Às guardas municipais cabia apenas proteger os bens, serviços e instalações municipais. E o Congresso está prestes a ampliar esse ruído constitucional.
O relator da PEC, senador Efraim Filho (União Brasil-PB), comemorou o avanço da pauta. Num vídeo em que aparece ao lado de agentes de trânsito uniformizados, ele declara que agora esses agentes poderão “praticar um policiamento ostensivo”: “Ali, no momento em que estão naquela via, controlando e fiscalizando o trânsito, (vão) poder atuar num flagrante de roubo, de furto, em uma tentativa de sequestro, um estupro”.
Como disse ao Estadão a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, “o que pauta o debate no Brasil sobre a segurança pública”, infelizmente, “é uma luta corporativista por ampliação de atribuição: todo mundo quer ser polícia” – entre outras razões, porque “ser polícia” dá acesso aos recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública.
O desfecho no Senado podia ter sido até pior. Os senadores rejeitaram uma emenda que incluía o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) entre os órgãos de segurança pública. O argumento é de que criaria conflito de competência com a Polícia Rodoviária Federal. Mas não será surpresa se, na subsequente tramitação da matéria, alguma aberração como essa for aprovada.
Trata-se de um evidente empobrecimento do debate sobre segurança pública. Não faz muito tempo, o governo entregou à Câmara uma PEC para tratar do tema, e as discussões mal começaram. Essa PEC até inclui as guardas municipais no sistema de segurança pública, mas não os agentes de trânsito, e seu foco é o combate ao crime organizado – esse, sim, o cerne do problema da segurança pública no País.
A CORRUPÇÃO DO IDEAL: REFLEXÕES ROUSSEAUNIANAS DE UM BRASILEIRO QUE (QUASE) SE CANDIDATOU, por Aurélio Marcos de Souza, advogado, ex-procurador geral do município de Gaspar (2005/08), graduado em Gestão Pública pela Udesc. Este artigo, originalmente, foi publicado nas redes sociais do autor
Já pensei algumas vezes, em silêncio ou em conversa com amigos, como seria me lançar na política. Não que eu tenha me candidatado de verdade — nunca aconteceu —, mas a ideia sempre me perseguiu. Talvez porque, como dizia Rousseau, o homem nasce bom, mas é a sociedade que o corrompe. E eu, com um coração cheio de esperança, queria acreditar que dava pra fazer diferente.
Na minha imaginação, eu seria aquele candidato raiz, que escreve o próprio discurso, que anda no barro, olha nos olhos das pessoas e escuta mais do que fala. Recusaria dinheiro de empresa grande, bateria na porta do vizinho e montaria um plano de governo ouvindo gente de verdade. Eu achava que dava pra entrar limpo e sair limpo. Acreditava, de verdade, que dava pra entrar com ética e mudar o jogo.
Mas aí você começa a entender como o jogo funciona — mesmo sem jogar. O partido pede aliança com aquele grupo que você criticou. O financiamento vem com nome bonito, mas com interesse por trás. E lá se vai a primeira promessa. Depois a segunda. Até que o discurso fica mais raso e os acordos, mais profundos. Como Rousseau já avisava, o problema não tá só nas pessoas, mas nas estruturas que vão domesticando quem entra nelas. Você não percebe o momento em que para de resistir — porque o sistema não te derruba, ele te desgasta.
No começo você diz “só dessa vez”. Depois vira “é o jeito que dá pra fazer”. Quando vê, já é parte da engrenagem que jurou enfrentar. A corrupção, como percebi, não é um ato pontual — é um processo. Não exige que você vire bandido de uma hora pra outra. Basta ir cansando, aceitando, cedendo. A cada concessão, um pedaço seu se perde.
É aí que o idealista encontra o espelho. E nem sempre gosta do que vê. Quanto mais você tenta mudar o poder por dentro, mais ele te muda. Rousseau diria que esse era o erro: tentar reformar um sistema viciado sem mexer na base. As instituições que deveriam servir ao povo acabam deformando até quem chega cheio de boas intenções.
Minha crítica, então, não é só ao político profissional que virou especialista em sobreviver no jogo. É também ao idealista — aquele que entra achando que é imune. O primeiro é conivente. O segundo, ingênuo. E os dois, no fim das contas, alimentam o mesmo ciclo. A diferença está apenas no tempo que cada um leva pra se render.
Mas olha, essa reflexão não é um convite ao desânimo. Ao contrário. É um chamado à coragem. A política, do jeito que está, não foi feita pra libertar — foi feita pra domar. E se a gente quiser algo diferente, precisa criar um outro jeito de fazer, de pensar, de escolher.
O começo disso tudo não é a candidatura. É a consciência crítica. É olhar de verdade pro sistema e entender que, sozinho, ninguém aguenta. Que nenhuma virtude sobrevive sozinha num modelo feito pra esmagar. E é aí que entra o coletivo, a mobilização, o povo de verdade — aquele que não se contenta mais em aplaudir ou xingar de longe, mas que resolve entrar, fiscalizar, construir, cobrar.
E aqui vai o meu chamado:
Aos Emílios recém-eleitos, que chegaram com vontade de fazer certo, com a alma leve e a consciência limpa — não se deixem levar. Não confundam jogo político com traição de princípios. Vocês ainda estão no começo, ainda dá tempo de resistir à sedução do conforto, à lógica do favor, à desculpa do “não tem outro jeito”. Lembrem-se do porquê entraram. Lembrem-se de quem acreditou em vocês. Lembrem-se de Rousseau: é mais fácil se manter íntegro fora do sistema do que tentar se purificar dentro dele.
O Brasil não precisa de mais políticos profissionais. Precisa de representantes que não esqueçam que estão lá por nós — e que não se vendam, mesmo quando ninguém estiver olhando.
Ainda dá tempo. Ainda dá pra ser diferente. Ainda há esperança nos Emílios — desde que não esqueçam quem são, nem o que prometeram antes de vestir o terno.
Este texto foi inspirado na obra Emílio, ou Da Educação, de Jean-Jacques Rousseau (1762), onde o autor propõe a formação de um jovem preservado dos vícios da sociedade. Para quem quiser ler, segue um exemplar em português: https://marcosfabionuva.com/wp-content/uploads/2011/08/emc3adlio-ou-da-educac3a7c3a3o.pdf
A AUDÁCIA UCRANIANA, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
A segunda rodada de negociações entre Rússia e Ucrânia em Istambul não produziu avanços. Durou menos de duas horas e foi marcada mais por silêncio do que por sinais de convergência. Os dois lados entregaram memorandos: a Ucrânia, propondo cessar-fogo e garantias de integridade territorial; a Rússia, exigindo que Kiev abandone a Otan, deixe regiões ocupadas e aceite um estatuto de subordinação – em outras palavras: rendição. Nada disso surpreende.
O que surpreendeu foi a ofensiva clandestina lançada por Kiev poucas horas antes. A operação Teia de Aranha atingiu quatro bases aéreas em território russo, danificando ou destruindo mais de 40 aeronaves, incluindo aviões A-50 e bombardeiros Tupolev, essenciais à doutrina russa de dissuasão e à sua campanha de mísseis contra cidades ucranianas. O impacto foi tanto simbólico quanto militar.
Foi a mais devastadora ofensiva ucraniana contra ativos estratégicos russos desde o início da guerra. Algumas das aeronaves atingidas são raras, caras e, em muitos casos, insubstituíveis, em razão da obsolescência da cadeia de produção militar russa. A Ucrânia, com recursos limitados, aplicou um golpe assimétrico: usou drones comerciais adaptados, ocultos em caminhões dentro do território russo, com comando remoto. O planejamento levou 18 meses.
Mais que um feito técnico, trata-se de um marco psicológico, que desmente a propaganda do Kremlin segundo a qual a vitória russa é inexorável, expõe falhas gritantes na segurança interna russa e revela que Moscou não consegue proteger sequer seus vetores nucleares. Internamente, o episódio provocou fúria entre os ultranacionalistas russos e mais uma rodada de recriminações entre chefes militares. Externamente, força aliados e analistas a revisarem suas premissas.
A Ucrânia não é uma peça passiva no xadrez da guerra. Mostrou engenhosidade, capacidade de penetração e inteligência operacional dignas das principais potências. Mostrou, sobretudo, que ainda sabe jogar – e com audácia. O contraste com a retórica teatral da Casa Branca é gritante. O presidente dos EUA, Donald Trump, que alterna ameaças e afagos a Putin, prometeu acabar com a guerra em “24 horas”, mas sua diplomacia oscila entre a condescendência e a ilusão, funcionando na prática como uma cortina de fumaça que abre espaço para manobras dilatórias do Kremlin e encoraja a aposta de Putin na fadiga do Ocidente para impor sua versão de paz sob ocupação.
A resposta americana à ofensiva ucraniana ainda é incerta. O Congresso, por iniciativa bipartidária, prepara sanções secundárias contra países que financiam o esforço de guerra russo via compra de petróleo. Iniciativa meritória, que precisa avançar – com ou sem a bênção presidencial. Mas não basta. As defesas aéreas da Ucrânia enfrentam esgotamento crítico, como ficou claro no ataque russo com 472 drones na véspera da operação Teia de Aranha. A reconstrução de sua capacidade antiaérea e a manutenção do fluxo de armamentos devem ser prioridades para qualquer potência que leve a sério a estabilidade europeia.
É compreensível que a Ucrânia aceite participar de rodadas de negociação – mesmo com a má-fé de seus interlocutores e sem expectativas de êxito. Isso a posiciona como parte da solução e ajuda a isolar o agressor. Mas não se deve confundir disposição ao diálogo com resignação. A diplomacia, para ser eficaz, precisa caminhar ao lado da dissuasão e ser sustentada por uma posição de força. A operação ucraniana mostrou que há fôlego para resistência e criatividade – e que Putin não detém o monopólio da iniciativa.
Se o Ocidente quiser preservar a ordem internacional baseada em regras e evitar que a chantagem militar se normalize como instrumento de política externa, precisa bancar a Ucrânia. Isso significa apoio militar sustentado, financiamento da reconstrução e coerência estratégica. O erro seria recair na armadilha da moderação ilusória, confundindo realismo com apaziguamento.
A Ucrânia provou que não está derrotada. A pergunta que se impõe é se o Ocidente está disposto a provar que não está rendido.
DÉFICIT FISCAL DAS ESTATAIS REFLETE A INCÚRIA FISCAL DO GOVERNO LULA, editorial do jornal O Globo
O déficit acumulado pelas estatais federais nos quatro primeiros meses deste ano bateu recorde: escalou a R$ 2,73 bilhões, maior nível da série histórica, de acordo com o Banco Central. No mesmo período de 2024, elas registraram perdas de R$ 1,6 bilhão — e o rombo cresceu até fechar o ano em R$ 6,73 bilhões. Reverteu-se, no governo Luiz Inácio Lula da Silva, a tendência a maior controle nessas contas que vinha se consolidando desde a gestão Michel Temer.
Os governos Temer e Jair Bolsonaro promoveram saneamento nas estatais federais dependentes do Tesouro (as que entram no Orçamento da União, e não as submetidas a regras de mercado, como Petrobras). Mas a situação voltou a se deteriorar no governo Lula. Talvez o maior símbolo da incúria sejam os Correios, cujos prejuízos somaram R$ 1,72 bilhão no primeiro trimestre do ano, mais que o dobro das perdas entre janeiro e março de 2024 — pior resultado para o primeiro trimestre desde 2017. As contas têm fechado no vermelho desde 2022. E o quadro contábil pode ser ainda mais crítico. A área técnica do Tribunal de Contas da União diz que a estatal burlou normas técnicas para declarar perdas menores em 2023 (o relatório, preliminar, precisará passar pelo plenário da Corte).
Diante de receitas em queda, prejuízos sucessivos e concorrência acirrada, funcionários relatam atrasos no pagamento de fornecedores, deficiências de manutenção nas agências e até falta de material de trabalho, como papelão, fitas adesivas ou envelopes. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) suspendeu voos dos Correios por preocupação com o transporte de produtos perigosos. Apesar da penúria e dos prejuízos, a estatal — com 83 mil funcionários e 10 mil agências — tem mimado seus dirigentes. Como mostrou reportagem do GLOBO, entre 2022 e 2023, os gastos com eles subiram 40%.
No governo Bolsonaro, os Correios haviam sido incluídos no Plano Nacional de Desestatização, com base num estudo robusto desenvolvido pelo BDNES para o setor. Em razão de pressões políticas e sindicais, a proposta não foi adiante no Congresso. Ao assumir, movido por resistência ideológica, Lula suspendeu a venda. Como a União ainda é a maior acionista da empresa, é inevitável que, cedo ou tarde, seus prejuízos caiam na conta do Tesouro.
Não surpreende o sufoco das estatais, desconectadas do mercado e sempre de portas abertas para apaniguados do governo. Quando não são desnecessárias, são mal geridas. O dispendioso Centro Nacional de Tecnologia Avançada (Ceitec), ressuscitado da liquidação pelo governo Lula para produzir semicondutores, nunca fez sentido numa área em que o Brasil é irrelevante. A obsoleta Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) vive no passado. Os próprios Correios não são nem sombra do que já foram — mesmo em bairros nobres do Rio, não há sequer entrega diária de correspondência.
A viabilidade das estatais deve ser analisada sob critérios técnicos. Não é razoável o governo dar sobrevida às que não param de pé. Excetuando as poucas estratégicas, a maioria deveria ser liquidada ou privatizada. Poupadas da competição por influxos de recursos do Tesouro, se tornam ineficientes, improdutivas e deficitárias. Só fazem agravar a situação de um governo que, em meio ao descalabro fiscal, tem recorrido a malabarismos, empenhado em avançar sobre o bolso do contribuinte para tapar buracos no Orçamento.
PROFETA DE ARAQUE, editorial do jornal O Estado de S. Paulo
Água é vida, mas no mundo de Lula da Silva, água é, acima de tudo, voto. Convicto dessa certeza, e demonstrando que pensa e trabalha com a cabeça exclusivamente na próxima disputa eleitoral, o presidente, já naturalmente em estado permanente de campanha, deflagrou a temporada populista de caça ao voto, surpreendendo até mesmo quem se acostumou ao seu modo palanqueiro de governar: em discurso durante um evento na região de Cachoeira dos Índios, no sertão da Paraíba, onde entregou um trecho da obra que integra o projeto de transposição do Rio São Francisco, o demiurgo petista se apresentou como um enviado de Deus para salvar os pobres da seca. “Graças a Deus, descobri uma coisa”, anunciou Lula, qual um profeta, para uma plateia selecionada. “Deus deixou o sertão sem água porque Ele sabia que eu ia ser presidente da República e que eu ia trazer água para cá.”
Em tom de quem tem poderes quase divinos, o presidente-candidato pregou seu evangelho – a crença de que, não obstante a reconhecida mediocridade do seu terceiro mandato, é o responsável pela redenção nacional. Lula lembrou à plateia dócil de militantes e moradores escolhidos a dedo que a obra em questão é esperada há 179 anos como forma de trazer água para a região, e precisou que ele chegasse à Presidência para garantir tal bem àqueles castigados pela escassez. “Essa obra é a redenção de um povo”, afirmou, triunfante.
Antes do discurso na Paraíba, Lula esteve em Salgueiro, interior de Pernambuco, onde assinou ordem de serviço para a duplicação da capacidade de bombeamento de água do eixo norte da transposição do São Francisco e, não satisfeito, citou realizações do seu governo e fez promessas a esmo. Nos dois palanques, prometeu crédito para moradia, preço baixo para o gás de cozinha e financiamento de motocicletas, além de informar, para a surpresa de rigorosamente ninguém, que viajará o Brasil inteiro após anunciar programas de crédito. É o roteiro habitual de quem governa sem pensar em outra coisa senão no próprio poder, na recuperação da popularidade perdida e na próxima eleição.
É Lula em estado bruto: enquanto o seu governo está fazendo água por todos os lados e amarga a impopularidade inclusive no eleitorado mais fiel ao presidente – a população mais pobre e os nordestinos –, ele só tem o palanque para recorrer. Engolfado pela incompetência do seu governo e pressionado pela proximidade do ciclo eleitoral de 2026, Lula acelera o populismo. Convicto de que é o pai dos pobres, ignora que, a despeito dos méritos de iniciativas como oferta de crédito e gás de cozinha mais barato para os mais pobres, nada, na prática, é de graça – e o País paga a conta de sua habitual demagogia.
O presidente e seus arcontes têm a mais plena certeza de que o Brasil gira em torno de Lula. Na teoria lulocêntrica, só ele é capaz de livrar o País e os brasileiros do mal maior – o bolsonarismo. Como, para o presidente, Deus só existe porque o diabo também existe, a seita lulopetista, também para existir, requer a existência de um inimigo tinhoso. No palanque pernambucano, Lula recorreu, como de praxe, à sua marotagem preferencial de justificar as falhas do seu governo ao passado, citando obras de casas e creches que teriam ficado paralisadas na gestão de Jair Bolsonaro. E, com seu linguajar próprio, concluiu, apontando para 2026: “A gente não pode votar em qualquer tranqueira para governar este país”.
Esse vício palanqueiro se mostra agora invariavelmente adornado pelas referências religiosas. Há alguns meses, em outra viagem a Pernambuco, Lula já havia transformado o palanque em missa de quermesse, usando, num só discurso, inacreditáveis 27 vezes “Deus” e “milagre”. Disse ter sido escolhido pelo “homem lá de cima” e definiu como um “milagre de fé” a obra que levará águas do Rio São Francisco ao agreste pernambucano. Lula, diria Santo Tomás de Aquino, quer fazer crer que seu governo está no terreno do mistério, isto é, que não se explica por meios racionais. Mas não há mistério nenhum: o PT de Lula, que esteve no poder em 15 dos últimos 22 anos, já se provou simplesmente incapaz de realizar os milagres que seu profeta de fancaria anuncia.
Para os bruxos do “novo” de Gaspar lerem e entenderem a razão disso.
BC COLOCA A COMUNICAÇÃO COMO PILAR CENTRAL DA SUA ESTRATÉGIA, por Alex Ribeiro, no jornal Valor Econômico
Agora que o Banco Central faz a calibragem final da taxa de juros, a comunicação passa a assumir um papel fundamental para garantir que o aperto monetário se prolongue pelo tempo necessário para cumprir a meta de inflação.
Desde que assumiu o cargo, em janeiro, o presidente do BC, Gabriel Galípolo, elegeu o aperfeiçoamento da comunicação como uma das prioridades de seu mandato. No caso da política monetária, isso envolve, de um lado, a comunicação com os especialistas, que é essencial para que os juros façam efeito com menos custo, e, de outro lado, a comunicação com a sociedade, para manter o apoio à autonomia do BC num período em que os juros altos fazem o trabalho de esfriar a economia para baixar a inflação até a meta.
Os pronunciamentos recentes dos membros do Comitê de Política Monetária (Copom) têm não apenas comunicado o caminho mais provável para a taxa de juros no futuro, mas também feito digressões e discussões sobre qual é a melhor forma de os banqueiros centrais se comunicarem, em especial num período de grande incerteza, como o atual.
O diretor de Política Econômica do BC, Diogo Guillen, disse, num evento em Washington, em abril, que releu um livro clássico de política monetária do economista Alan Blinder para rever os ensinamentos sobre como agir em situações como a atual. Deve-se ir com mais cautela, manter a flexibilidade e ser transparente sobre como pretende reagir se o cenário econômico não se desenrolar na forma hoje prevista.
O diretor de Assuntos Internacionais do BC, Paulo Picchetti, num tradicional evento de política monetária organizado pelo economista José Julio Senna, do FGV Ibre, citou outro clássico, de William Brainard, sobre como lidar com a incerteza em política monetária.
Talvez a mais completa exposição sobre como se comunicar em situações como a atual tenha sido a do professor Michael McMahon, da Universidade de Oxford, que deu uma palestra magna na Conferência Anual do Banco Central, disponível no YouTube.
Na teoria econômica, tudo parece muito simples. Existe a solução do Pico da Neblina: o BC pode subir os juros rapidamente para resolver de uma vez o problema inflacionário, para logo em seguida cortar. E existe a solução do Morro da Baleia, um morro da Chapada dos Veadeiros que parece uma baleia deitada: subir os juros sem grandes exageros e mantê-los assim por muito tempo.
O livro-texto diz que ambos são equivalentes e fazem o mesmo serviço. Mas a realidade é diferente. Se subir com muita fúria, o BC pode fazer uma barbeiragem, causando uma recessão ou uma crise financeira. A outra opção também é problemática: os mercados sempre vão desconfiar que o BC não vai manter os juros altos por tanto tempo quanto promete, as expectativas de inflação vão subir e o juro real será corroído.
O Banco Central já vem dizendo que, nessa fase de calibragem, o mais importante passa a ser manter os juros altos por muito tempo. Galípolo diz mais: vai ser preciso juros altos por mais tempo do que no passado. As projeções de inflação ainda estão acima da meta. Está claro que a estratégia do BC é o Morro da Baleia.
Com os juros muito altos, em 14,75% ao ano, a estratégia faz sentido, já que o risco de efeitos colaterais cresce exponencialmente. Mas fica o desafio de manter a credibilidade perante os mercados. As pesquisas de McMahon mostram que, felizmente, a boa comunicação de política monetária pode reduzir muito esses custos.
Uma alternativa, proposta por alguns economistas, é o Copom assumir um compromisso de manter os juros inalterados por um tempo determinado ou de não baixá-los enquanto algum indicador-chave não der certeza de que a inflação vai cair para a meta. McMahon não recomenda isso, porque sempre o cenário muda e o banqueiro central é obrigado a voltar atrás na sua promessa. “Muitos perderam seus cargos”, disse.
A alternativa é o Banco Central comunicar como acha que a economia vai evoluir no futuro e também o que pretende fazer se as coisas caminharem de forma não esperada – ou seja, detalhar a sua função de reação.
Essa é a estratégia adotada pelo Copom. O comitê traçou o seu cenário básico para a inflação e indicou o que hoje acha necessário: manter os juros altos por muito tempo. Mas o Copom também tem dito que, hoje, as incertezas são maiores do que o usual, por isso não pode se apegar a uma promessa para os juros. O que pode garantir é que vai reagir a surpresas da forma como sempre reagiu no passado.
A discussão é se o BC não poderia detalhar cenários de incerteza, mostrando como reagirá. Por exemplo, qual seria o impacto na inflação se o governo se desesperar com a desaceleração econômica e fizer uma nova expansão fiscal? E qual seria a resposta em termos de juros para isso?
Numa revisão recente do arcabouço de política monetária do Banco da Inglaterra, que inspirou o formato brasileiro, o ex-presidente do Federal Reserve Ben Bernanke sugeriu que fossem divulgados mais de um cenário alternativo.
Galípolo deu indicações de que não gosta muito da ideia. Quando um BC dá muitos cenários, os participantes do mercado se aferram ao pior deles. É quando o excesso de comunicação pode atrapalhar.